O cisco e a trave... (Mt 7,1-5)
Fedro,
o fabulista latino, conta que Júpiter pendurou em nossas costas uma mochila com
nossos vícios e defeitos. Em nosso peito, outra mochila com os pecados dos
outros. Por isso temos a facilidade de criticar as falhas alheias e somos
complacentes com nossos pecados, que permanecem fora de nossa visão.
Hoje,
Jesus usa duas imagens em contraste: o cisco, pequena palha de vegetal, e a
trave, pesada viga de madeira. A ironia do Mestre denuncia nossa incapacidade
de agir como juízes do próximo e apontar para o cisco em seus olhos, pois nosso
olhar está prejudicado pela trave que fingimos não ver.
Os
magistrados mais sérios conhecem a dificuldade em julgar um réu quando lhe são
apresentados os agravantes e atenuantes de qualquer infração à lei. Por seu
lado, os advogados trabalham em um terreno oscilante, onde muitos truques podem
ser usados para incriminar o inocente ou salvaguardar o criminoso. Não raro,
após a sentença, o próprio juiz aconselha uma das partes a entrar com recurso,
pois entende que não se fez a justiça adequada.
São
também conhecidos os casos em que, após longos anos de prisão, um condenado é libertado
graças ao aparecimento do verdadeiro criminoso. É este, aliás, um poderoso argumento
contra a pena de morte. Por isso, conhecendo como ninguém o coração humano,
Jesus decreta: “Não julgueis!” E dá-nos um valioso princípio ético: “A medida
que usardes para os outros servirá para vós”.
Na
verdade, é princípio já expresso na Oração do Senhor: “Perdoa as nossas
dívidas, assim como perdoamos aos que nos devem”. (Mt 6,12) Muitas vezes, não
nos conduzimos de acordo com a oração que tanto repetimos...
Se
levamos a sério as palavras do Pai-Nosso, certamente não fazemos campanha pela
pena de morte nem estendemos o dedo indicador na direção dos pecadores
públicos. Ao contrário, trocaremos a justiça gravada na pedra pela misericórdia
pulsante na carne. É bem provável que também nós, em nosso julgamento, venhamos
a precisar da misericórdia divina...
“Censores
apressados e severos de seu próximo sucumbem a esta paixão porque não guardam
perfeitamente a lembrança e o cuidado constante de seus próprios pecados. De
fato, se alguém, desembaraçado do véu de complacência para consigo mesmo, visse
exatamente seus próprios males, já não poderia cuidar de outra coisa por toda a
sua vida. E avaliaria que todo o tempo que lhe resta não seria suficiente para
afligir-se consigo mesmo”. (S. João Clímaco)
Orai sem cessar: “Senhor, meu pecado
está sempre diante de mim!” (Sl
51,5)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade
Católica Nova Aliança.
Nenhum comentário:
Postar um comentário