domingo, 24 de junho de 2018

PALAVRA DE VIDA


 E esteve no deserto... (Lc 1,57-66.80)
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   João Batista, o precursor do Messias, cuja missão era apontar o Cordeiro de Deus, identificando-o no meio da multidão, viveu no deserto antes de sua breve atividade às margens do Jordão. Afastado dos homens, convivendo com as feras, alimentando-se daquilo que a natureza áspera lhe oferecia, vestido de couro como os demais profetas, ele soube crescer no silêncio. Sem o deserto, como ouvir o Espírito de Deus que fala no silêncio?

            No mundo bíblico, o deserto desempenha um notável papel. O próprio caos inicial (cf. Gn 1,2) anterior à ação ordenadora do Logos divino pode ser comparado a um deserto. Pelo deserto vagavam as tribos nômades em sua errância. Foi no deserto, por quarenta anos, que o povo de Israel caminhou em círculos, pedagogicamente guiado e confundido por Yahweh. É ao deserto que o Senhor atrai a esposa infiel, para reacender no coração dela as brasas do amor conjugal (Os 2,16).
            Foi no mesmo áspero areal que João Batista se recolheu, junto às rochas áridas do Mar Morto, para ouvir apenas a voz do Vento que sopra onde quer. Tal como experimentara Elias em sua caverna (1Rs 19), o permanente sopro do Espírito iria despojá-lo de todas as humanas ambições, deixando-o centrado exclusivamente no sonho de Deus.
            Em seu admirável livro “O Pobre de Nazaré”, Frei Ignácio Larrañaga apresenta duas hipóteses para a precoce retirada de João Batista ao deserto. Seus pais, de idade avançada, poderiam ter morrido ainda na infância de João. Ou então, diante dos acontecimentos maravilhosos que tinham envolvido sua concepção e nascimento, a própria Isabel, sua mãe, o teria separado e consagrado ao Senhor, escolhendo a solidão do deserto como seu retiro permanente.
            Seja como for, fica evidente que o silêncio é o lugar necessário para a escuta da voz interior, o sussurro do Espírito que conduz o homem em sua missão. No ruído cacofônico das ruas e praças, entre buzinas de automóveis e os gargarejos das guitarras eletrônicas, a voz de Deus acaba neutralizada, nossos ouvidos são tapados, o coração petrificado. Isto explica boa parte das angústias e depressões de nosso tempo...
            O próprio Jesus, mesmo sendo Filho de Deus, retirava-se habitualmente das pressões da multidão e subia à montanha para, em oração, ouvir do Pai as inspirações necessárias à sua missão.
            Se alguém quer ouvir a Deus e, como João, discernir sua missão, trate de encontrar o seu deserto...
            Em meu dia-a-dia, consigo fabricar algumas ilhas de silêncio? Ou ainda sou arrastado pela vertigem do barulho?
Orai sem cessar: “Fala, Senhor, que teu servo escuta!” (1Sm 3,10)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

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