E não sereis julgados... (Mt 7,1-5)
O operário se
distrai um instante, e a prensa amassa sua mão. O motorista se distrai um
segundo, e eis o acidente mortal. Mas a mais grave das distrações que podemos
cometer é perder de vista que um julgamento nos espera. Aliás, isto está
registrado entre os mistérios de fé que proclamamos ao rezar o Símbolo dos
Apóstolos, quando afirmamos crer que “Jesus há de vir para julgar os vivos e os
mortos”.
Na Carta aos
Hebreus, o autor sagrado nos recorda: “Está determinado que os homens morram
uma só vez, e logo em seguida vem o juízo”. (Hb 9,27) Juízo e julgamento são
sinônimos: significa estar diante de um Juiz que tem poderes para nos libertar
ou condenar após examinar nossas ações. Mesmo deixando de lado a antiga
Sequência da Missa de Defuntos, que falava em um “dia de ira”, a certeza do
juízo deve orientar nossos passos.
O absurdo cresce
quando, esquecidos de que seremos réus ao fim de nossa vida, dedicamos nosso
tempo a julgar os outros. Na linguagem do Mestre de Nazaré, “apontamos para a
palhazinha no olho do próximo, mas nos esquecemos da trave em nosso próprio
olho”. Jesus gostava de usar contrastes, acentuando-lhes os traços. Neste caso,
ele contrasta um pequeno cisco e uma enorme peça de madeira. E quanto maior a
nossa “trave”, tanto menos teremos noção de nossos próprios erros e pecados, ao
mesmo tempo que amplificamos as falhas dos outros.
Aquele que julga
o próximo e se reveste da toga de juiz, acredita ser instrumento da justiça.
Ocorre que, ao julgar, ele usurpa um privilégio do próprio Cristo, pois cabe ao
Senhor julgar os vivos e os mortos (cf. Mt 25,31-33). Nesta passagem, o
“julgamento” é uma separação. Por isso mesmo, a espada que separa tem sido
usada como símbolo da justiça. Ovelhas de um lado, cabritos do outro; uns irão
para o Reino do Pai, outros para o fogo eterno.
Nesta passagem de
Mt 7, Jesus nos alerta: “Não julgueis!” E explica: seremos julgados com a mesma
medida com que julgamos os demais: rigor com rigor, misericórdia com
misericórdia. O grande erro de fundo consiste em ignorar que nós mesmos – desde
que o Filho de Deus se encarnou, sofreu e morreu por nós – fomos objetos de uma
misericórdia infinita: “quando éramos pecadores, Cristo morreu por nós” (Rm
5,8).
Se eu acuso a
palha de meu irmão enquanto tenho uma trave no meu olho, sou hipócrita. Mas se
acaso estou vendo claro, sem sombras e distorções, é porque a trave já me foi
tirada pela Graça de Deus e, neste caso, devo usar da mesma misericórdia que
recebi quando notar a palhazinha de meu irmão.
O contínuo
desfile de criminosos no noticiário da TV não nos deve levar ao esquecimento de
nossos próprios erros. Como dizia um santo: “Eu também seria capaz disso...”
Orai sem cessar: “Deus tenha misericórdia de nós e nos abençoe!” (Sl 67,1)
Texto
de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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