Seja
feita a vossa vontade... (Mt
6,7-15)
É estranho como um ato essencialmente
religioso – a oração – possa ser o campo de tantos desvios, tantos enganos,
tanta corrupção! Que as tribos primitivas oferecessem “iscas” para amansar os
espíritos e os orixás, entende-se. Mas um cristão fazer da oração uma
ferramenta para dobrar Deus diante de suas próprias vontades, não dá para
entender...
Entretanto, ainda existem cristãos
dispostos a rezar para “dobrar” a Deus, dominá-lo por meio de “orações de
poder” cujo efeito seria automático, sem perceber que estão confundindo a vida
de oração com o exercício da magia.
Neste Evangelho, a pedido dos
próprios discípulos (cf. Lc 11,1), Jesus de Nazaré nos ensina uma oração em que
filhos se dirigem a um Pai. É a oração dominical ou o Pai-Nosso. Nela,
expressamos três aspirações e fazemos três pedidos. Do mais profundo do fiel,
brotam as aspirações pela santificação do Nome de Deus, pela vinda do Reino e
pelo cumprimento da vontade divina aqui na terra, tal como se cumpre no céu. E
seguem as súplicas pelo pão cotidiano, o essencial, pelo perdão de nossos pecados
e pela libertação do maligno.
Se Jesus nos ensina a rezar assim, é
porque tudo isto está de acordo com a vontade do Pai. E seria loucura total
pretender que uma oração nossa – por mais engenhosa e sábia - pudesse forçar
Deus a fazer alguma coisa que ele mesmo não quer. Pois acontece: cristãos que
rezam para que o Senhor Onipotente faça a vontade... deles!
Como observa o exegeta Hébert Roux,
“toda petição é vã se não se inspirar nas verdadeiras necessidades que Deus
conhece e revela, que não se atenha ao dom de Deus e ao cumprimento de sua
vontade. Aqui também trata-se da justiça do Reino, que se cumpre em Jesus
Cristo, e não aquela que o homem natural acredita realizar. A verdadeira oração
é uma ação de Deus no homem, e não uma ação do homem sobre Deus”.
Ridícula pretensão a nossa se
pretendemos orientar Deus sobre o que fazer em nossas vidas: ele sabe o que
fazer! A oração se torna autêntica quando aquele que reza se declara disposto a
cumprir os desígnios do Senhor: “Mostra-me, Senhor, os teus caminhos; guia-me
na senda reta!” (Sl 27,11)
O exemplo perfeito de oração Jesus
no-lo deu em sua agonia: “Pai, se quiseres, afasta de mim este cálice; mas não
se faça a minha vontade e, sim, a tua!” (Lc 22,42) Fica bem claro: toda
preferência nossa, todo impulso pessoal, toda conveniência fica subordinada a
uma vontade maior, que é a vontade do Pai. E seria um absurdo imaginar que
nossa vontade fosse mais eficaz e justa que a vontade de Deus.
Logo antes da Comunhão, rezamos o
Pai-Nosso. É que, entrando em simbiose com Jesus, o Filho, nós também somos
filhos dispostos a cumprir a vontade do Pai.
Orai sem cessar: “Meu Deus, que eu cumpra a tua vontade!” (Sl 40,8)
Texto
de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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