Moveu-se de compaixão... (Mt 14,13-21)
Quantos pães? Cinco. Quantos peixes?
Dois. Quantas bocas? 5.000 – sem contar as bocas de mulheres e crianças, que a
cultura da época não recenseava. Quantos cestos de sobras? Doze.
A pregação da moda ignora os números
e as quantidades para realçar a importância da “partilha”, reduzindo o milagre
ao esforço humano, às possibilidades do grupo, às realizações da comunidade.
Ora, amigos, ninguém dá o que não
tem. Para partilhar, só tenho a minha fome, que vai de encontro à fome de meu
irmão. Logo, devo procurar em outra parte a “explicação” do milagre, como se um
milagre tivesse explicação...
Ou terá?
A única explicação dos pães
multiplicados está no versículo 14: “Ao sair do barco, Jesus viu uma grande
multidão. Encheu-se de compaixão por eles e curou os que estavam doentes”.
É imensa a multidão. Maior ainda é a
misericórdia desse coração movido por emoções e sentimentos, o coração de
Jesus. No texto grego deste Evangelho, a palavra que traduzimos por “encheu-se
de compaixão” é o verbo “esplagnísthe”, em cujo interior se esconde uma
víscera do abdome: o baço. Temos, em português, o adjetivo “esplênico”, com a
mesma raiz. Por isso mesmo, gosto da tradução da Ir. Jeanne D’Arc, OP: “Il
est remué jusqu’aux entrailles pour eux” [Ele se revolve até as entranhas
por eles].
É impossível não pensar no termo
hebraico rahamim, que o Antigo Testamento emprega para falar da
misericórdia de Deus, mesmo antes da Encarnação do Verbo. Rahamim é um
substantivo plural que designa o útero materno ou, por extensão, as vísceras do
abdome, ali onde as emoções “dão frio na barriga” e somatizam em vômitos e
soluços os sentimentos que nos abalam.
Neste Evangelho, a visão da multidão
sedenta da verdade – mais que faminta de pão! – golpeia o mais profundo do ser
de Jesus. Ele sente e ressente. Ele se comove. E faz o grande milagre...
E é por isso que nós ainda não
fazemos milagres. O espetáculo diário contemplado por nossos olhos ainda não
chegou a mexer com nosso baço, a revolver nosso fígado, a enternecer nosso
coração. Os grandes santos da história da Igreja tinham as mesmas entranhas de
misericórdia que moveram Dom Bosco, Dom Orione e Madre Teresa de Calcutá.
Sejamos sensíveis...
Orai sem
cessar: “Nós e nossos irmãos somos todos da
mesma carne” (Ne
5,5)
Texto de
Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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