Caminhando sobre as águas... (Mc 6,45-52)
Sobre o lago,
noite escura, apenas os Doze Apóstolos são testemunhas de que Jesus caminhou
sobre as águas. Ninguém mais viu sua caminhada. Jean Valette, pastor da Igreja
Reformada na França, fala sobre esta marcha:
“Ela não
aconteceu diante dos fariseus que esperavam este gênero de demonstração para
crerem, ou seja, para serem dispensado da fé. Ela ocorreu diante dos discípulos
que, ao seguirem Jesus, deram o primeiro passo da fé sem nenhuma garantia. Esta
caminhada interpela homens cuja fé ainda está quase toda reduzida ao amor que
eles têm pelo Mestre, no qual essa fé precisa ser iluminada. Eles ainda não
sabem a Quem estão seguindo. E como o amor é essencial, Jesus procura
esclarecer sua fé dando-lhes sinais.”
Os
racionalistas exigem provas. Não vão entrar no barco antes de terem
comprovações palpáveis. Mas Jesus não dá provas a ninguém. Apenas sinaliza...
Valette prossegue:
“Sinais, e
não provas. A prova logo convence, pois obriga o homem a um gênero de fé que é
apenas a submissão a uma evidência exterior. Porém, como ela não exige nenhuma
participação do homem, nada saberia modificar nele a não ser suas crenças. Já o
sinal é mais lento para penetrar, pois exige uma adesão pela qual o homem se
acha interiormente transformado. Essa lentidão se manifesta nas dificuldades
que os discípulos têm para crer.”
Basta o
milagre para nós creiamos? Seria a “prova” definitiva? Judas também estava na
barca e...
Eis que as
potências do mar se dobram diante da palavra e do gesto de Jesus Cristo. Ele
domina os poderes demoníacos que habitam o oceano, sempre dispostas a
reconduzir o caos inicial, anterior à ordem da Criação. E aqui temos o sinal da
chegada do Reino de Deus: “é simultaneamente a vitória de Deus sobre as forças
hostis desencadeadas na Criação e a utilização das realidades criadas para a
salvação do homem”.
Juntamente
com o sinal, o Mestre orienta seus seguidores aterrorizados pelo espetáculo da
natureza hostil: “Não tenham medo!” Desde as origens o homem teve medo diante
do fragor da tempestade, da fúria do vento, da voracidade das enchentes, do
segredo da floresta, do mistério das cavernas. O mesmo medo que o levou a
inventar rituais para dominar os “espíritos” da natureza, a pintar animais nas
grutas, a sacrificar crianças aos deuses sangrentos.
E Jesus, que
domina a natureza e a pacifica, vem repetir: “Não tenham medo!” A ignorância e
a superstição podem elevar o homem a confundir Deus com o misterioso, o
indeterminado. Deus pode ser associado a um fantasma e às imagens ameaçadoras
do próprio inconsciente. Mais dia, menos dia, seremos chamados a caminhar sobre
as águas. O medo tentará impedir-nos. A fé nos mostrará o caminho...
Orai sem cessar: “Tu
me indicas o caminho da vida!” (Sl 16,11)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova
Aliança.

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