Eu vos lavei os pés... (Jo 13,16-20)
Se a história humana inclui um ato
de rebeldia, um grito de autonomia, desde o seu início (cf. Gn 3), não admira
que sejamos mais dispostos a dar ordens do que a obedecer, a mandar que servir.
No centro, a questão do poder.
Ao longo dos séculos, o “poder”
tem-se concentrado na posse da terra, na superioridade das armas, no capital
acumulado, no domínio da informação. Reis e imperadores davam ordens. Generais
e exércitos dominavam. Banqueiros e capitalistas tomavam decisões. Sábios e
doutores manipulavam as mentes. Os outros, obedeciam e faziam o trabalho
pesado.
Jesus, Mestre e Senhor, veio
implodir o sistema. Na Ceia Pascal, ele retira o manto (símbolo de poder),
prende uma toalha na cintura (como um servo) e põe-se a lavar os pés de seus
discípulos (como um escravo)... Imaginem o mal-estar de seus seguidores, os
mesmos discípulos que, mais de uma vez, andaram discutindo qual deles seria o
vice-rei e o primeiro ministro quando Jesus instaurasse o seu Reino em
definitivo!
É natural que os filhos queiram a
glória de seu pai. Que os empregados se orgulhem do sucesso de seu patrão. Que
o povo admire a grandeza de seus reis. E ali, bem diante de seus, olhos está um
Guia, Senhor e Mestre que faz um “papelão”, humilhando-se de forma jamais
vista. Pior: findo o exercício de “pobreza”, o Mestre põe-se a ensinar: “Assim
como eu vos fiz, fazei também vós, uns aos outros!” É provável que eles se
tenham entreolhado. Primeiro no rosto. Em seguida, nos pés... E lutaram contra
os sentimentos que vinham à tona de seu coração rústico de galileus...
Não é fácil também para a Igreja. É
permanente a tentação de gloriar-se com os cargos e os ministérios. Ou o risco
de criação de castas superiores e inferiores. E de se perder o sentido
primitivo de palavras como “ministro” [em latim, minister: servidor] ou “diácono” [do grego diákonos: garçom]. A palavra “ministro” vem de “menos” [minus]: assim sendo, quem ministra não
deve sonhar com “mais” honra, “mais” poder e “mais” destaque. Ministro serve
como um garçom... O atual exemplo do Papa Francisco nos anima a rever nossas
atitudes em relação ao poder e ao serviço.
Um título do Papa é o de “servus servorum Dei” – o servidor dos
servidores de Deus. Já nosso amado João Paulo II vestia bem este múnus:
superando todas as limitações (quando muitos optariam por um justo e merecido
repouso), ele insistiu em servir a Deus e à Igreja, gastando os últimos alentos
de sua vida, atravessando o planeta em todas as direções e – como Jesus –
dando-nos o modelo de vida.
Diante de tudo isso, devemos
examinar nossa consciência e verificar: minha religião faz de mim um servidor?
Ou um patrão?
Orai sem cessar: “Senhor Jesus, ensina-me a servir!”
Texto
de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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