Escutai-o! (Mc
9,2-10)
Deve
ter sido apaixonante a experiência de subir ao Tabor com o Mestre, mas teria
sido apenas um espetáculo de pirotecnia se a explosão de luz não fosse seguida
da obediência. Terá sido consoladora a ideia de erguer três barracas no alto da
montanha e ali acampar para sempre, mas o projeto acabaria em rotina se não
fosse um tempo de escuta. Pode ser que muita gente ande buscando visões e
revelações de Deus, mas talvez sejam poucos os fiéis dispostos a ouvir sua
Palavra e pô-la em prática (cf. Mt 7,24).
Os
exegetas entendem – não sem razão – que Jesus escolheu três de seus seguidores
mais íntimos para que experimentassem a glória do Tabor antes de passarem pela
humilhação do Calvário. Algo que tivesse o efeito de uma “vacina”, imunizando
os três apóstolos contra a decepção e o escândalo da cruz.
De
fato, a experiência cristã se situa no espaço entre duas montanhas: uma,
elevada na glória das vestes luminosas; a outra, mergulhada no despojamento da
nudez absoluta. Não é possível optar por apenas uma delas. Elas se completam.
No Tabor e no Calvário, a morte e a vida combatem de modo admirável [mors et vita conflixere mirando], como
recorda a sequência da missa da Ressurreição. Na primeira montanha, ouve-se a
voz do Pai; na segunda, em sete palavras, a voz do Filho.
Para aqueles que hesitam em ouvir o
Filho, São Leão Magno [395-461] sugere uma exortação vinda do Pai:
“Escutai-o sem hesitação, pois ele é
verdade e vida, ele é minha força e minha sabedoria. Escutai-o, a ele que os
mistérios da Lei anunciaram e a voz dos profetas cantou. Escutai-o, a ele que
resgata o mundo por seu sangue, que acorrenta o diabo e toma-lhe as armas, que
rasga a fatura da dívida e o pacto da prevaricação. Escutai-o, a ele que abre o
caminho do céu e que, pelo suplício da cruz, vos prepara os degraus para
subirdes ao reino. Por que temeis ser resgatados? Por que, feridos, tendes medo
de ser curados? Que se faça o que quer o Cristo, assim como também eu o quero.”
“Bem-amados – prossegue Leão Magno
-, estas coisas não foram ditas apenas para a utilidade daqueles que as ouviram
com seus ouvidos, mas nestes três apóstolos, é a Igreja inteira que apreende
tudo aquilo que viram seus olhos e captaram com seus ouvidos. A voz do Pai que
se fez ouvir deve ressoar sempre à nossa audição: ‘Este é meu Filho bem-amado,
no qual eu me comprazo, escutai-o!’ Ele, que vive e reina com o Pai e o
Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.”
Não deixa de ser curioso que os
fiéis seguidores de Jesus Cristo tenham passado seu tempo terrestre
preferencialmente na segunda montanha, após breves lampejos da primeira...
Orai sem cessar: “Ouvirei o que diz o Senhor Deus!” (Sl 85,9)
Texto de Antônio Carlos Santini, da
Comunidade Católica Nova Aliança.
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