Padecesse muito... (Mc 8,27-33)
Mais uma vez, Jesus decepciona seus seguidores. Simão Pedro acabara de proclamar a Jesus como o Messias prometido (este é o sentido da palavra grega “Cristo”, isto é: o “ungido”). Logo em seguida, sem tempo de respirar, os discípulos ouvem pela primeira vez, da boca do próprio Mestre, a profecia de sua paixão, morte e ressurreição. E tudo é apresentado como uma “necessidade”: “Era necessário que padecesse muito... Que morresse... E ressuscitasse depois de três dias...”
Teriam eles ouvido até o fim? Compreenderam o anúncio da ressurreição? Eram capazes de crer em um milagre tão grande? Ou nem mesmo ouviram o fim da frase, com as vísceras já revolvidas pela simples ideia da morte do Senhor?
Todos conhecem a reação primária de Pedro, a ponto de o discípulo chegar a repreender seu Mestre pela impropriedade daquele anúncio. Na atitude do velho pescador, a reação tão comum em todos nós: prontos à glória do Tabor, mas tão vexados com a humilhação do Calvário. Não ocorreu a nenhum deles o pensamento de fazer três tendas sobre a rocha nua do Gólgota...
Não é fácil enfrentar o tempo que segue à crucifixão. É isto que digo em meu soneto “Depois do Calvário”:
O Cristo que eu abraço decepciona,
Pois se recusa ser um vencedor:
Estende os braços para a Cruz, e à dor
Inteiramente livre, se abandona.
Ele perdeu a luta. Foi à lona.
A plateia o vaiava com furor.
Em pleno dia, o Sol perdia a cor
E a Vida se acabava à hora nona.
É noite. O anfiteatro está vazio
E desce da Montanha um vento frio,
Em cujo sopro uma oliveira dança...
Se o fracasso de Deus chegou ao cúmulo,
Só me resta ficar guardando o túmulo,
Gemendo um pranto feito de esperança...
Orai sem cessar: “Fomos curados graças às suas chagas...” (Is 53,5)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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