No outro mundo... (Lc 16, 19-31)

Uma narrativa costurada em dois tempos: neste mundo, o pobre entre dores e o rico entre gozos; no outro mundo, as posições invertidas. E... para sempre, sem remissão... Detalhe curioso: esta é a única parábola de Jesus em que um dos personagens tem nome: Lázaro (ou Eleazar), que significa, em hebraico, “Deus ajuda”. Já o apelido do rico indiferente – Epulão – é posterior e não consta do original.
Entre os dois “tempos”, a morte como um limiar e uma virada, que tudo multiplica por (–1), invertendo todos os valores. O mendigo sofredor acaba no “seio de Abraão” (imagem do Céu), enquanto o rico gozador acaba atormentado no inferno (dispensa imagens!). O rico tenta um recurso paradoxal: pede a Abraão uma espécie de mediação do próprio Lázaro, para refrescar sua sede infernal. O mesmo que, antes, negara migalhas de pão, agora suplica por uma gota d’água...
Como isto era impossível, pois um abismo intransponível (chaos magnum, em latim) impede o contato entre céu e inferno, o condenado mostra preocupação com seus cinco irmãos que ainda vivem na terra e – supõe-se – viviam um estilo de vida semelhante ao que ele mesmo havia escolhido. Pede que o fantasma de Lázaro vá alertá-los. E ouve do Pai Abraão a resposta: “Eles têm Moisés (a Palavra escrita, lógos) e os Profetas (a Palavra viva, rhema). Basta ouvi-los!”
O ricaço desesperado ainda tenta argumentar que a aparição de um morto entre os vivos teria mais impacto e os levaria à conversão. E logo recebe a crua resposta: quem não está disposto a ouvir a Lei e as Profecias, onde fala o próprio Deus, também não daria ouvidos a um possível fantasma...
Quantas lições para nós! Não se vive impunemente. Haverá uma retribuição proporcional. Ficar surdo à Lei de Deus é coisa séria, de graves consequências. A indiferença ao pobre que passa ao nosso lado é uma indiferença mortal!
Prefiro, contudo, fixar-me em uma única lição: existe um OUTRO MUNDO. Este mundo material não é o único. Aliás, este é provisório, passageiro. O outro, sim, é definitivo, tecido de eternidade. E viver a vida como se nada houvesse além deste mundo, é pura insanidade!
Afinal, para que mundo nós estamos vivendo?
Orai sem cessar: “A ti, Senhor, o pobre se abandona confiante!” (Sl 10, 14)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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