Minhas mãos e meus pés... (Lc
24, 35-48)
Como foi difícil para os discípulos aceitar a realidade
da ressurreição de seu Mestre! Ainda hoje, temos dificuldade em compreender que
a morte não tem mais a última palavra em nossa vida...
É por isso que Jesus ressuscitado precisa
“identificar-se” diante dos apóstolos: “Sou eu mesmo! Vejam minhas mãos e meus
pés!” Jesus não apresenta seu CPF nem sua Carteira de Identidade. Ele mostra as
mãos e os pés...
Que notável processo de identificação! Eu sou minhas
mãos. Eu sou os meus pés. Eu sou aquilo que fiz: sou meus atos, meus gestos,
meu trabalho. Eu sou a estrada por onde andei, os trilhos que escolhi entre
tantos atalhos deste mundo.
Mas as mãos e os pés do Ressuscitado ainda estavam
ornadas com as marcas da Paixão: eram mãos e pés perfurados pelos cravos do
Calvário. É como se Jesus dissesse: “Eu sou aquilo que sofri...”
Não seria esta uma excelente “identificação” para cada um
de nós? Sofremos para nascer, sofremos para crescer, sofremos para morrer. E
essa aura de sofrimento nos torna pessoas “apaixonadas”, mergulhadas na Paixão
de Cristo. Eu sou aquilo que sofri.
Viktor Frankl, o admirável neurologista vienense, propôs
que o homem já não fosse visto como “homo
sapiens” (= o que sabe), mas como “homo
patiens” (= o que sofre). É ali, diante de sua cruz – pessoal e
intransferível -, que a pessoa humana revela toda a sua grandeza.
Depois da Paixão de Cristo, o sofrimento humano já não
pode ser visto como simples desgraça ou acidente. Como observa François
Trévedy, “é um homem perfurado que se apresenta aos discípulos; e se existe um
céu, é pelas perfurações desse homem que o céu é visível e respirável. Homem
estranho pelas incompletudes irreparáveis de sua carne, estranho Deus, em quem
até as ausências são reveladoras, e os vazios, e as lacunas! Certeza desse
Deus, garantida por suas faltas e por esse possível lugar que Ele nos reserva
em Si mesmo”.
Jesus não se limita a abrir as portas do céu, após rasgar
o véu do Templo de Jerusalém. Ele rasga seu próprio Templo, seu Corpo
crucificado. E sem esta Porta, ninguém acha o caminho do céu...
Orai sem
cessar: “E a mão do Senhor estava com eles...” (At 11, 21)
Texto de Antônio Carlos
Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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