Hipócritas! (Mt 23,13-22)
Nesta série de ásperas cominações
que Jesus arremessava contra escribas e fariseus, a razão de palavras tão duras
era a grande distância entre o que eles ensinavam publicamente e o que eles
viviam em seu íntimo. A transmissão da doutrina fora por eles transformada em
um aranhol de minúcias que mais afastava do que aproximava de Deus, enquanto o próprio
coração da Lei não era levado em conta. Na expressão do próprio Jesus, “coavam
a mosca e engoliam o camelo”.
E o pior era a atitude de manter uma fachada digna de elogios e respeito,
enquanto o interior cheirava mal, merecendo para eles o rótulo de “sepulcros
caiados”. O termo “hipócrita”, de origem grega, designava alguém que
interpretava um papel no palco. No teatro grego (e a Palestina helenizada
ostentava teatros de arena nas grandes cidades) o ator usava uma máscara, que
os romanos chamavam de “persona”, pois a voz do ator “soava” através dela (daí
o termo “personalidade”).
Claro, teatralizar é fingir. A atriz chora com a máscara trágica, mas no
íntimo não está sofrendo. O ator ri com a máscara cômica, mas no íntimo pode
estar amargurado. Há um descompasso entre o lado de fora (a máscara) e o lado
de dentro (o coração). É possível que o próprio Jesus de Nazaré, vizinho de
Cesareia de Filipe, tenha presenciado uma dessas encenações. Daí o termo
“hipocrisia”.
Só que nossa relação com Deus não é nenhum teatro, não inclui encenações.
E foi a falta de sinceridade no culto e na vida dos homens ligados ao Templo o
alvo da denúncia de Jesus, o mesmo que sempre acolhia o humilde rebaixamento de
quem não se julgava digno de receber favores (cf. Mt 8,8; 15,27).
O monge do deserto Macário, o Grande
[300-390 d.C.], nos exorta:
“Esforcemo-nos, pois, por nos
convertermos com um coração sincero e nos aproximarmos de Deus. Não
desesperemos de nossa salvação. Se nos parece difícil, até mesmo impossível,
converter-nos dos inumeráveis pecados dos quais já contraímos o hábito,
lembremo-nos e consideremos como o Senhor, em sua bondade, devolveu a vista aos
cegos, restabeleceu os paralíticos, curou todas as doenças, ressuscitou os
mortos já quase decompostos e desfeitos na terra. Quanto mais Ele não
converteria uma alma que se volte para Ele, implore sua misericórdia, peça sua
ajuda! Ele em pessoa estará pronto a nos socorrer. É por isso que Ele é
misericordioso, vivificador, curando paixões incuráveis, realizando a redenção
daqueles que o invocam e se voltam para Ele.”
Somos todos pecadores. Qualquer
tentativa de simular santidade é perda de tempo e de energias. Como Davi,
confessemos nosso pecado...
Orai sem cessar: “Cria em mim, ó Deus, um coração puro!” (Sl 51,12)
Texto de Antônio Carlos Santini, da
Comunidade Católica Nova Aliança.
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