A
boca fala da abundância do coração. O que aflora da boca é como a fonte da
montanha, mas lá em baixo, nas profundezas da rocha, está o manancial. Se o
manancial é puro, a água da fonte também o será. Se o manancial é tóxico, assim
também a fonte...
Habitualmente,
quais são os nossos assuntos dominantes? De nossas palavras, que sentimentos se
manifestam? Até a música de nossa voz (mais grave ou aguda, mais rápida ou
pausada) pode revelar nosso mundo interior. Nosso “coração”. Li, em artigo do
foniatra Pedro Bloch, que um dos critérios para seleção dos astronautas
americanos é o timbre de sua voz: vozes agudas denotam excessiva emotividade,
incompatível com as situações de risco que deverão encontrar em suas missões.
Durante
anos, senti-me incomodado por um companheiro que insistia em contar piadas
inadequadas, que sempre tinham como personagens padres e freiras. Um dia, perdi
a paciência e lhe disse: “Você já notou que está sempre a denegrir a imagem dos
padres e das freiras. Isto é sinal de algum problema aí dentro... Você nunca
pensou em procurar um psiquiatra?” Para meu espanto, ele nunca mais voltou às
piadas em minha presença. E eu fiquei pensando: “Por que demorei tanto tempo a
tomar uma atitude? Quanto tempo eu perdi!”
Com
certeza, você conhece pessoas de voz amável, pacífica, sempre a falar de
aspectos luminosos da vida, realçando o lado positivo das pessoas, capazes de
enxergar um fiapo de luz na escuridão. Deve conhecer também o oposto: gente que
enxerga logo o único ponto negro na superfície da folha branca de papel e, se
necessário, arranja uma boa lupa para ampliar o ponto.
Conhecerá,
talvez, pessoas amargas, que vivem a se lamentar, a reclamar da ingratidão e da
maldade alheia. Gente que ignora a alegria de abençoar e bendizer. Gente que
desconhece a ação de graças, o sorriso amigo, o silêncio que finge não ver...
Nossa
Seleta escolar dos tempos do ginásio trazia uma pequena narrativa. Na
Palestina, à beira da estrada, apodrecia a carcaça de um cão morto. As pessoas
passavam, desviavam o rosto e reclamavam do mau cheiro. Passou um Rabi, olhou e
comentou: “Que belos dentes ele tinha!” Dizem que o Rabi era Jesus Cristo...
Será
que a beleza não está nas coisas, mas dentro de nós?
Orai sem cessar: “Na minha
boca, eu só tinha o teu louvor!” (Sl 71,8)
Texto de
Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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