terça-feira, 23 de setembro de 2014

PALAVRA DE VIDA

Por causa da multidão...(Lc 8,19-21) 
           Deixo de lado o aspecto central deste Evangelho. Fiquemos em um detalhe: Maria e os “irmãos” de Jesus procuram por ele, mas não podem fazer contato “por causa da multidão”...

            Se utilizamos o método “alegórico” – tão ao gosto dos Padres da Igreja primitiva – podemos ver a “multidão” como um obstáculo entre Jesus e aqueles que pretendem encontrá-lo. A multidão é ruidosa e tende ao caos. Quem conhece o burburinho de uma feira popular sabe que ali não é o melhor lugar para um encontro íntimo e profundo.
            A multidão é causa de muitas distrações: a cacofonia dos pregões, os veículos que buzinam, o colorido das mercadorias, o perfume das flores e das frutas – tudo isso vem ocupar e desviar os sentidos humanos. É impossível não recordar a Canção III do belíssimo Cântico Espiritual, de São João da Cruz: “Buscando meus amores, / Irei por estes montes e ribeiras; / Não colherei as flores, / Nem temerei as feras, / E passarei os fortes e fronteiras.
            “Não colher as flores” – é o próprio Autor quem interpreta – significa abrir mão dos contentamentos e deleites que se apresentam em nossa vida, e que se tornam obstáculos, impedindo que passemos adiante para o encontro com o Senhor. Eles ocupam o coração, impedem o despojamento e a liberdade para caminhar em busca do verdadeiro amor.
            Assim é a multidão, com seus atrativos. Da multidão vêm os aplausos (quando temos sucesso material) e os apupos (se seguimos o Evangelho). É a turba que acena com seus “produtos”, tornados indispensáveis pela propaganda que induz ao consumismo. A multidão é a dona da “opinião pública” – o Ibope -, que impõe a todos a sua ditadura, a ponto de exigir verdadeiro heroísmo de quem pretende ser autêntico e seguir seu próprio caminho.
            O contrário da multidão é o deserto. Ali Jesus se recolheu, em jejum e oração, preparando-se para vencer a tríplice tentação. O contrário da multidão é a montanha, aonde Jesus sobe para ouvir o Pai e realizar o difícil discernimento. O contrário da multidão é o Calvário, onde Jesus entrega sua vida, acompanhado apenas por João e umas poucas mulheres...
            Queremos encontrar Jesus? Onde o procuramos? No deserto ou na multidão?

Orai sem cessar: “O Senhor me erguerá sobre um rochedo!” (Sl 27,5)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

Nenhum comentário:

Postar um comentário