Túmulos dissimulados... (Lc 11,42-46)
Neste Evangelho, ao invectivar os
fariseus de seu tempo, Jesus usa de tintas fortes para realçar o contraste (e a
neurose!) entre uma aparência de piedade e um coração impiedoso. Como diz o
povo mineiro, “por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento”...
A imagem utilizada pelo Rabi da
Galileia – como de costume, extraída do cotidiano da Palestina – refere-se ao
antigo hábito de caiar os túmulos para deixá-los bem visíveis. Assim,
buscava-se evitar que alguém, inadvertidamente, viesse a encostar-se em um
deles e, em consequência, tornar-se ritualmente impuro, o que obrigaria o
infrator a longos ritos de abluções e purificação por um período de sete dias
(cf. Nm 19,16). Claro que, mesmo caiados e muito alvos por fora, o interior dos
túmulos conservava a mesma podridão...
A intenção de Jesus é deixar bem
claro que a religião de alguém não deve ser medida por gestos exteriores e
picuinhas devocionais, que de nada hão de valer se o interior do homem não
corresponder às atitudes externas. Ora, os fariseus da época costumavam
gabar-se da mais estrita observância da Lei mosaica e dos 613 preceitos
rabínicos, chegando a hipervalorizar pequenos detalhes legais, como o dízimo
sobre as ervas e os temperos, muito além da exigência escrita. Ao mesmo tempo,
esses homens “religiosos” eram capazes de explorar os mais pobres, como as
viúvas sem proteção. É bem verdade que nossa época também conserva os seus
fariseus...
Em resumo, Deus vê o coração, as intenções mais profundas do
espírito humano. Simular devoção enquanto se alimenta um vício oculto merecerá
a um de nós o mesmo rótulo citado por Jesus Cristo: sepulcros caiados. Uma
pequena esmola não esconde nossa avareza. Atitudes polidas podem ocultar o ódio
mais cego. Promessas de amor ocultam intenções devassas.
Pior ainda, quando o nome de Deus é usado
como fonte de lucro e de espoliação dos mais pobres! Ou quando algum
conhecimento teológico é utilizado para zombar da fé dos mais simples, tantas
vezes feita a canivete, sem maior polimento!
Sem dúvida, Deus aprecia o homem
virtuoso. Mas sabe que toda virtude é dom. Não é o esforço atlético que nos
aproxima de Deus... Apenas buscamos corresponder a um amor infinito, derramado
sobre todos, sem distinção.
Orai sem
cessar: “No meu
coração, conservo as tuas ordens!” (Sl 119,11)
Texto de
Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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