Aquele que o traiu... (Mc 3,13-19)

Este Evangelho realmente faz pensar... Interrompendo a roda-viva de seu
ministério, Jesus vai passar a noite inteira em oração, no silêncio da
montanha. Ora, a montanha é lugar bíblico do encontro com Deus. Por certo,
Jesus conversava com o Pai acerca da escolha que faria ao amanhecer, convocando
os Doze como colunas de sua Igreja. E um deles foi Judas Iscariotes...
Será que Deus se enganou? Será que o
Filho ouviu mal as indicações do Pai? Teria havido um lamentável engano?
Claro que não! Tal como Pedro, Tiago
e João, os três apóstolos que deram a vida por seu Mestre, também Judas Iscariotes
trazia esse mesmo potencial apostólico e a mesma missão evangelizadora. Por
que, então, acabaria tragicamente como traidor? Mistério profundo! Nada que a
mente humana possa avaliar com exatidão. Mistério, porém, que diz respeito a
cada um de nós...
Os exegetas acreditam que Judas
Iscariotes fosse um dos dois ex-guerrilheiros (cf. “duas espadas”, Lc 2,38) que
acompanhavam Jesus. Teria Judas a esperança de “usar” o prestígio e a força de
Jesus para um projeto de libertação militar e social do povo judeu dominado
pelos romanos? E teria sido dominado pela decepção quando Jesus demonstra
claramente que seu “Reino” era de outra ordem?
Em latim, o mesmo verbo “tradere”
se traduz por “entregar” e “trair”. Ainda que Judas fosse venal e escravo do
dinheiro (cf. Jo 12,6), convenhamos que 30 moedas – o preço de um escravo! –
era muito pouco para mudá-lo em traidor de um Mestre que já demonstrara sua
estatura sobre-humana em curas e milagres. Existe aí algo que ultrapassa nosso
humano entendimento. O mistério permanece...
Também nós temos sido testemunhas de
grandes feitos do Senhor. Temos contemplado a ação surpreendente de sua Graça
na vida dos santos. Temos admirado a fé de tantos mártires que testemunharam
com o próprio sangue sua adesão a Cristo. Mesmo em nossa vida pessoal Deus tem
demonstrado sua presença de forma admirável. Não bastam estes “sinais” para que
nossa fidelidade permaneça até o fim?
Em nota, a Bíblia de Navarra
comenta: “A traição de um íntimo é muito mais dolorosa e cruel que a de um
estranho, porque supõe uma falta de lealdade. Também a vida espiritual do
cristão é verdadeira amizade com Cristo, por isso assenta sobre a lealdade, a
honradez e a fidelidade à palavra dada”.
Nos momentos difíceis, que nosso
amor não desfaleça...
Orai sem cessar: “Senhor, não me deixes
desviar de teus preceitos!” (Sl 119,10)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova
Aliança.
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