Está fora de si! (Mc 3,20-21)
A frase é
dos “parentes” de Jesus. Os “seus”. E a tradução está adocicada, em forma de visível
eufemismo. No texto da Vulgata, São Jerônimo traduziu: “in furorem versus
est”. Na minha infância, se dizia “está doido furioso”.
Talvez
devamos desculpar os familiares de Jesus de Nazaré. Afinal, depois de trinta
anos de vida apagada, dedicado ao simples mister de carpinteiro, nas pegadas do
humilde José, Jesus deixa sua pobre aldeia, cerca-se de numerosos seguidores e
começa a se comportar como um misto de rabi e de profeta. Ou, quem sabe, aos
olhos de muitos, como um agitador das massas... Era mesmo para pensar em
desequilíbrio mental... Em sua inquietação, o grupo dos parentes chegará a
pressionar a própria mãe de Jesus (cf. Mc 3,31-32) para ir trazê-lo de volta a
Nazaré.
Bem, no
fundo, eles tinham razão. Jesus estava mesmo “fora de si”. É sua marca
registrada: estar fora de si, nunca girar em torno de si mesmo, mas ser uma
pessoa centrífuga, sempre voltada para o outro, a ponto de não ter tempo de
comer um pedaço de pão, afirma este Evangelho.
E não foi
assim a vida dos santos? Não é assim, ainda hoje, a vida dos cristãos
perseguidos em tantos países? Quando foi que Madre Teresa de Calcutá teve tempo
para ficar “dentro de si”? As andanças de João Paulo II, o globetrotter
da fé no Séc. XX, o mantinham sempre “extro-vertido”, arrebatado para fora de
si. Um homem assim abre mão do teatro, da literatura, da filosofia, do
alpinismo e de todos os gostos pessoais para se dedicar tempo integral a uma
missão avassaladora. E – curioso, não? – é exatamente a missão que irá revelar
a verdadeira face do missionário: o santo.
Uma jovem
bonita renunciar ao matrimônio, família e filhos, para se dedicar a crianças
remelentas da África pobre? Loucura! Um jovem rico abrir mão da herança paterna
para cuidar da saúde dos nativos do Congo? Loucura! Um casal de médicos
recém-formados transferir-se para Rondônia e, ali, fazer de sua casa uma
espécie de hospital permanente para pobres sem assistência médica? Loucura!
Benditos
loucos! Só mesmo Deus sabe quanto bem eles espalharam à sua volta! Quantas
vidas foram salvas! Quanta esperança foi semeada em um mundo de angústias e desesperos...
Ser cristão
é imitar Jesus Cristo. Será preciso optar entre uma vida centrípeta – centrada
nos próprios interesses, vantagens e comodidades – e uma vida “fora de si”.
Neste último caso – e só assim - estaremos imitando Jesus.
Orai sem cessar: “A loucura de Deus é mais sábia que os homens...” (1Cor 1,25)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova
Aliança.
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