Nem eu te condeno... (Jo
8,1-11)
Os
mais antigos documentos do Evangelho de João omitem esta passagem. Entretanto,
como observa a Bíblia de Jerusalém, não há dúvidas quanto à historicidade do
acontecimento, nem quanto à canonicidade do texto. Fica, então, a pergunta
curiosa: - Por que teriam omitido esta perícope do Evangelho durante um bom
tempo?
Alguns
comentaristas acenam para uma possibilidade: esta história de perdoar – tão
facilmente! – uma pecadora pública parece um tanto escandalosa. Não é fácil de
digerir. Os moralistas e os fariseus (exato aqueles que saíram com o rabo entre
as pernas...) preferem a aplicação da lei, fria e cega. Ademais, um perdão tão
rápido, sem penitências nem reparações – não estimula o mau procedimento dos
outros? Como fica o aspecto exemplar das punições?
Não
fica. Simplesmente, não fica. Em geral, nossa justiça humana permanece presa ao
passado: errou, tem de pagar! E mesmo após cumprida a pena, perdura o estigma
do lado de fora (na pele) e o remorso do lado de dentro (no coração). A justiça
divina é diferente: olha para o futuro. Deus contempla o pecador e divisa o
santo escondido sob as escaras do pecado.
Urs
von Balthasar comenta que este Evangelho aponta para o futuro, onde a salvação
de Deus cria a novidade para a qual nós nos apressamos. Nossa vida consistirá
em nos dirigir para esta salvação divina. Ele diz:
“O
Evangelho nos mostra pecadores que, sob o olhar de Jesus, acusam outro pecador.
Mostra Jesus que, como se estivesse ausente, escreve sobre o solo. Apenas por
duas vezes ele rompe o silêncio: a primeira vez, para reunir acusadores e
acusada na comunidade do pecado; a segunda vez, para pronunciar seu perdão –
pois ninguém pode mais condenar a outrem. Diante de seu sofrimento mudo para
todos, toda acusação deveria também calar-se, pois ‘Deus encerrou todos os
homens na mesma desobediência’ - não
para os punir, como desejariam os acusadores – mas para ‘fazer misericórdia a
todos’ (Rm 11,32).
Se
ninguém pode condenar a mulher – conclui von Balthasar -, isto não se deve apenas
à primeira palavra de Jesus, mas muito mais à segunda: ele sofreu por todos, a
fim de adquirir para todos o perdão do céu, e por essa razão ninguém mais pode
acusar o outro diante de Deus.”
Sim,
eu sei que os moralistas continuam insatisfeitos. Assim sendo, queiram
responder a esta pergunta: se era para julgar e condenar o pecador – como eu e
você -, para que teria morrido na Cruz o Salvador do Mundo? Se não foi para lavar
o pecador, atomizar o pecado, sumir com ele do mundo, não terá sido inútil a
sua morte?
Orai sem cessar: “Perto está
o Senhor, e salva os contritos!” (Sl 34,19)
Texto de Antônio Carlos Santini,
da Comunidade Católica Nova Aliança.
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