Nem uma vírgula... (Mt 5,17-19)
Como
a Lei incomoda! Quanta ginástica para contorná-la, adocicá-la,
instrumentalizá-la. E Jesus deixa bem claro: “não vim abolir, mas cumprir”...
O
verbo “cumprir” [do latim “complere”,
isto é, preencher, fazer por completo] não significa simplesmente atender a
determinadas exigências, mas inclinar-se para a Voz de Deus em busca de seu
sentido pleno e, lógico, adequar a própria vida a ela.
Desde
o Antigo Testamento, a Lei do Sinai não era vista como um conjunto de algemas a
impedir a liberdade das pessoas, mas uma rede de salvaguardas que permitiria ao
povo escolhido atravessar o deserto da escravidão rumo à pátria de liberdade.
Na verdade, Israel se gabava de ter recebido a Lei de Deus – e não outro povo
-, vendo nesse dom um sinal da predileção divina.
Não
é preciso muito imaginação para avaliar o que seriam 40 anos deserto a dentro
enquanto os pais eram desrespeitados, os bens alheios rapinados, a mulher do
vizinho cobiçada! Hoje, em nosso deserto pós-moderno, sabemos o bem o resultado
de uma vida sem lei...
Atribui-se
a Maquiavel a frase: “Para os amigos, os favores; para os inimigos, a lei”.
Como se a lei – divina ou humana
– fosse algo negativo, incômodo, asfixiante, e não uma ferramenta de libertação
dos feitores que invadem o coração do homem: a gula e a ambição, a fraude e a
luxúria, a ira e avareza, entre outros. Em lugar de cassar nossa liberdade, a
Lei vem orientá-la para o bem.
Os
romanos pensavam elogiar a lei ao afirmar: “Dura
lex, sed Lex” [a lei é dura, mas é lei]. Já o salmista aponta em direção
oposta: “Ah! Quanto amo, Senhor, a vossa Lei! Quão saborosas são para mim
vossas palavras, mais doces que o mel à minha boca! Vossa palavra é um facho
que ilumina meus passos, é uma luz em meu caminho!” (Sl 119, 97.103.105)
Em
nosso tempo, multiplicam-se os legisladores contorcionistas que se dedicam a
legalizar o ilegítimo, chegando ao extremo absurdo de dar ao cidadão o direito
de matar uma pessoa no ventre da própria mãe. No tempo de Jesus, os legistas
consideravam “legal” declarar como “corban”
– isto é, consagrados a Deus – os bens materiais que não desejavam gastar no
sustento dos próprios pais necessitados (cf. Mc 7,11).
Daí
a importância e a atualidade das palavras de Jesus: nem uma vírgula da Lei será
abolida, mas levada à perfeição. Uma lei como o imperativo “Não matarás!”
permanece ressoando muito além das encostas do Sinai. É uma lei eterna.
Orai sem cessar: “Minha
herança, Senhor, é guardar vossa Palavra!” (Sl 119,57)
Texto de Antônio Carlos Santini,
da Comunidade Católica Nova Aliança.
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