sábado, 16 de abril de 2016

PALAVRA DE VIDA

 Muitos se retiraram... (Jo 6,60-69)
                Terrível mistério a liberdade humana! Tomar consciência da própria liberdade é uma experiência vertiginosa. Um passo a mais, e caímos no abismo da autodeterminação, da recusa do Pai, da soberba, enfim. A mesma tentação primordial de “ser como deuses” (Gn 3,5) que arrastou nossos primeiros pais.

               Em nossa religião – isto é, nossa “relação com Deus” - a natureza humana está sempre predisposta a buscar um “deus” ao nosso gosto. É a religião self-service. Temos nosso próprio conceito, nosso próprio modelo, ao qual a divindade se deveria adaptar. Se estamos enfermos, buscamos Esculápio, o “deus-que-cura”. Se passamos aperto financeiro, buscamos Mammon ou Moneta, o deus-dinheiro. Se queremos prazer, namoramos Eros e Afrodite. Temos todo um panteão à nossa disposição.
               Aí, vem o verdadeiro Deus e nos convida a abraçar a cruz, caso queiramos segui-lo. Devemos abrir mão de nossos sonhos e vaidades, projetos de poder e conquista, jogando no lixo do tempo as ilusões que nos desviam da Verdade. É quando nos decepcionamos com Deus e saímos em busca do ídolo que estiver de plantão...
               No Evangelho de hoje, Jesus decepciona bom número de seus seguidores. São judeus, afeitos a um estrito código alimentar com raízes no Levítico. Não é qualquer carne que se pode comer! E o Rabi da Galileia vem com uma estranha história de comer sua carne e beber o seu sangue?! Ora, sim, senhor... Antropofagia, não!
               Apenas um caso, entre outros, de má vontade para entender o sentido espiritual das propostas divinas. Assim como nós também recusamos o “não matarás” e aprovamos o aborto ou defendemos a pena de morte (para os outros, é claro!). Assim como insistimos em separar do bolo aqueles que “merecem” ser nosso próximo, excluindo todos os párias da sociedade, como se não fossem nossos irmãos... Fazemos vista grossa para as realidades espirituais (como o valor sublime da vida humana) e nos atrelamos aos aspectos da vida material, como garantir segurança e evitar incômodos.
               Não deixa de ser irônico: exatamente quando Jesus anuncia que será nosso Pão de eternidade, entregando-se a nós como alimento, é ali que ele vem a perder a maioria de seus seguidores! Do mesmo modo, quando os discípulos perceberem que o Mestre não fugirá da cruz, fugirão dele...
               E nós? Também queremos abandoná-lo?
Orai sem cessar: “Basta-te a minha graça!” (2Cor 12,9)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

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