Sentiu fome... (Mc 11,11-26)
Mais
uma vez, os Evangelhos nos mostram com simplicidade, mas com realismo, o lado
humano de Jesus. E cai por terra a antiga heresia dos docetistas, segundo os
quais a humanidade de Jesus Cristo seria mera “aparência”.
Na
carne dos mortais, nascido de Mulher, o Filho de Deus tem fome. À beira do poço
de Jacó (Jo 4,6-7), ao sol do meio-dia, vamos encontrá-lo cansado e com sede.
Se morre o amigo Lázaro (Jo 11,35), o homem Jesus chora com a dor de todos os
humanos. Em sua agonia (Lc 22), o Filho de Maria sua sangue sob a pressão da
angústia. Cravado na cruz, ele brada: “Tenho sede!” (Jo 19,28.)
Apesar
disso, quando apontamos Jesus como nosso modelo de vida cristã, sempre surge
alguém para contrapor: “Mas ele era Deus!” E esse “defeito” – sua divindade! -
deveria descartá-lo em definitivo como nosso exemplo de vida. Sim, de fato
Jesus era Deus, mas voluntariamente despojado de seus atributos divinos, igual
a nós em tudo, exceto no pecado (Hb 4,15).
Gratos
que somos ao Senhor, que se fez vítima de propiciação para nos salvar, vemos
crescer ainda mais a nossa confiança quando nos lembramos de sua humanidade.
Não se trata de um deus pagão, mergulhado nas nuvens etéreas do Olimpo,
indiferente à nossa condição humana.
Como se lê na
Carta aos Hebreus, “não temos nele um pontífice incapaz de se compadecer de
nossas fraquezas. Ao contrário, passou pelas mesmas provações que nós, com
exceção do pecado”. Com a Encarnação do Verbo, o Forte se fez fraco. O Infinito
se fez pequeno. O Eterno entregou-se à passagem do tempo. O Criador do trigo
passou fome. O inventor da água passou sede...
Se
aqui e ali, episodicamente, Jesus Cristo também demonstrava sua divindade com
(raros!) gestos de poder, como quando serenou a tempestade ou multiplicou os
pães, no seu dia-a-dia ele se submeteu por inteiro às vicissitudes do comum dos
mortais. E nada o demonstra mais claramente que a contemplação dos admiráveis
ícones do Oriente, com o Menino a mamar na Virgem Mãe. É a “Virgem da
Humildade” [ou Galaktotrophousa, a que alimenta com leite], manifestando
toda a fragilidade e a dependência escolhida pelo Filho de Deus.
Depois
disso, como reclamar de nosso trabalho e do esforço que a existência cobra de
nós? Humano e despojado, Jesus caminha conosco todos os dias de nossa vida...
Orai sem cessar: “Tenho
sede de Deus!” (Sl 42,3)
Texto de Antônio Carlos Santini,
da Comunidade Católica Nova Aliança
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