Ai de ti! (Mt 11,20-24)
O Evangelho de hoje
mostra um lado “sombrio” na pregação de Jesus. O mesmo Rabi que cantou as
bem-aventuranças para os pobres, os que choravam, os que tinham sede de
justiça, desta vez despede “mal-aventuranças” sobre aqueles que não
reconheceram os sinais do Messias em seu meio.
Obviamente, não são
pragas nem maldições, impossíveis em um coração feito de misericórdia. Estas
cominações apenas registram um risco que todos nós corremos nesta vida: deixar
passar uma graça que não volta. Perder o bonde da salvação. Desperdiçar as
oportunidades que Deus oferece gratuitamente a cada pessoa que vem a este
mundo.
É assim que Jesus
chega ao extremo de cotejar Corozaim e Betsaida – duas cidades do povo
escolhido por Deus – com Tiro e Sidônia, duas cidades da Fenícia, região
habitada por um povo idólatra e politeísta. E, nesse paralelo, as cidades
judaicas levam a pior: receberam a mais e não corresponderam aos excessos do
amor de Deus...
Esse tipo de pregação
devia acender um profundo ódio entre os ouvintes da Galileia, pois os hebreus
se sentiam superiores aos povos vizinhos e únicos destinatários da salvação. Em
Tiro, por exemplo, conhecido porto e centro comercial, explorava-se um molusco
marinho (o múrex) para a produção da valiosa
tintura de púrpura. Verdadeiras montanhas de carapaças desse molusco
acumulavam-se na praia da região, exalando forte mau cheiro. Os judeus
consideravam a região como impura e inabitável para um fiel. A comparação feita
por Jesus acenderia muitas iras...
O tom de certa mágoa
nas palavras do Mestre manifesta uma constante de seus sentimentos: a profunda
tristeza de ser rejeitado pelo seu próprio povo. O Evangelho de São Lucas, de
modo especial, repetirá elogios aos estrangeiros que demonstravam mais fé que
os “de sua casa” (cf. Lc 4,23-27; 7,9; 17,18; 23,47).
A Igreja – o novo
Israel – também corre o risco de se vangloriar como “povo escolhido” e ignorar
os sinais que o Senhor realiza em seu meio, chamando a uma contínua conversão.
Podemos ignorar Jesus que passa disfarçado em nossas ruas, enquanto celebramos
um culto sem alma.
Deus permita que nós
não acabemos ouvindo a mesma lamentação: “Ai de vós!” Fiquemos atentos aos
apelos amorosos do Senhor...
Orai sem cessar: “Minha felicidade é estar perto de Deus!” (Sl
73,28)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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