Eis o Cordeiro de Deus! (Jo 1,29-34)
Um gesto,
uma frase, e está cumprida a missão do Precursor: identificar diante dos homens
de seu tempo Aquele que vinha como a vítima de Deus pela humanidade...
Para um
judeu daquele tempo, a palavra “cordeiro” permanecia rica de ressonâncias. No
presente, os cordeiros eram sacrificados sobre o altar do Templo, em rito de
adoração ao Senhor Yahweh. No passado, um cordeiro (Gn 22,13) dera a vida para
que Isaac, o filho bem-amado, tivesse a vida preservada. Na noite da
libertação, ao deixar o Egito, o povo de Israel fora preservado da incursão do
Exterminador graças ao sangue de um cordeiro (Ex 12,22-23) aspergido sobre as
vergas dos portais. Daí em diante, em cada Páscoa, um cordeiro sem mancha –
tipo do Messias – fazia-se presente à mesa de cada família judaica. Era o
Cordeiro Pascal.
Assim, dizer
“cordeiro” era dizer “vítima= hóstia” a ser oferecida a Deus. O cordeiro dá sua
vida para que os outros não venham a perdê-la. Se, entretanto, por uma deriva
que atingiu todo o inconsciente coletivo do povo escolhido, estavam à espera de
um Messias vencedor, glorioso general libertador, não fora essa a imagem que
Isaías lhes passara, ao retratar o Messias como um cordeiro mudo, que se deixa
levar sem protestos até o matadouro. (Cf. Is 53,7.)
No célebre
retábulo de Issenheim, em Colmar - hoje no museu de Unterlinden -, a pintura de
Matthias Grünewald retrata a Crucifixão de Jesus. À direita do espectador, em
intencional anacronismo, está João Batista. De pé, traz na mão esquerda o livro
aberto da Palavra de Deus, do qual se irradia a luz que ilumina todo o quadro.
Com a mão direita, ele aponta para o Crucificado. No fundo, a frase, em latim:
“Importa que ele cresça, e eu diminua.” (Cf. Jo 3,30.) E aos pés do Batista,
vê-se um alvíssimo cordeiro, de cujo peito aberto corre um fluxo de sangue
recolhido em um cálice de ouro. Entre o cordeiro e Jesus, na cruz, um processo
de identificação.
No fundo do
retábulo, a noite escura. E é no meio dessa noite que o Cordeiro de Deus nos
vem trazer a vida e a salvação.
Como João
Batista, nós somos chamados a apontar o Cristo para o mundo, a identificar
Aquele que o mundo não conhece. Aceitaremos a missão?
Orai sem cessar: “Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo,
dai-nos
a paz!” (da Liturgia
Eucarística)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova
Aliança.
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