sexta-feira, 23 de março de 2012

PALAVRA DE VIDA

Procuravam tirar-lhe a vida... (Jo 7,1-2.10.25-30)
            Incômodo para o establishment religioso dominado pelos saduceus, ameaça para o instável equilíbrio do governo de Herodes, agitador indesejável para Pilatos, Jesus deve morrer. Autêntica pedra de tropeço, o Rabi da Galileia torna-se alguém insustentável no sistema de forças da Palestina romana. Por isso mesmo, registra João, “os judeus procuravam tirar-lhe a vida”.
            Trabalho inútil, na verdade, pois o próprio Filho de Deus se encarnara, nascendo de mulher, exatamente para dar a sua vida. Não era necessário forçar aquilo que o próprio Jesus se dispunha a fazer. São suas palavras: “O Pai me ama, porque dou a minha vida para a retomar”. (Jo 10,17.) E aqui lemos um roteiro que inclui a Paixão e a Ressurreição. E logo a seguir: “Ninguém a tira de mim, mas eu a dou de mim mesmo e tenho o poder de a dar, como tenho o poder de a reassumir”. (Jo 10,18.)
            Jesus é a Vida. “Nele havia vida e a vida era a luz dos homens.” (Jo 1,4.) Ele mesmo se apresenta assim: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. (Jo 14,6.) Uma vida que se deixa triturar, amassar e comer: “Eu sou o pão vivo que desci do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente”. (Jo 6,51a.)
            Estamos diante de um mistério: os homens procuram destruir a vida de quem veio vivificá-los. Decidem tirar a vida daquele que é a sua única opção diante da morte eterna. Aqui se manifesta o poder que está na raiz de uma civilização que faz opção pela morte. Os gregos antigos já haviam percebido o trágico combate entre Eros, o princípio da vida, e Tânatos, o princípio da morte.
            Jesus, o Verbo encarnado, vem superar este antagonismo por meio de um gesto de amor: dar a vida por aqueles que Deus ama. Ele aceita ser uma hóstia, isto é, uma vítima que caminha livremente para o sacrifício, tal como antevira o profeta Isaías: “... ele tomou sobre si as nossas enfermidades e carregou com nossos sofrimentos... Foi maltratado e não abriu a boca, como um cordeiro que se conduz ao matadouro.” (Is 53,4.7.)
            Oferecendo-se pela humanidade, Jesus rompe a engrenagem dos polos em agonia. O espírito do mal não percebe que sua aparente vitória selava em definitivo a sua derrota. No alto do Calvário, ao entregar o espírito, Jesus reformula a própria condição humana: “Eu amo, logo aceito morrer.” A liturgia do Domingo de Páscoa celebra essa vitória:
A morte e a vida se bateram
Num admirável duelo.
O Rei da vida, morto,
Reina vivo.
Orai sem cessar: “Seremos salvos por sua vida.” (Rm 5,10)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

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