Nas mãos dos homens... (Mt 17,22-27)
Os teólogos mais recentes,
explorando um veio paulino, não se cansam de realçar a “descida” do Filho de
Deus, seu despojamento (sua kênosis). Na verdade, trata-se de algo que
ultrapassa nossa capacidade de compreensão: Deus se faz homem. O eterno se
submete ao ciclo temporal. O Infinito se deixa conter no seio da Mulher. O
Imortal se entrega à morte.
Neste Evangelho, ao anunciar pela
segunda vez a sua Paixão e Morte, Jesus frisa que tal “entrega” se faz “nas
mãos dos homens”. Logo ele, o Filho de Deus, que prefere apresentar-se como o Filho do Homem! O Verbo de Deus, segunda
Pessoa da Trindade, abre mão, por um tempo, da glória, do poder e da alegria de
ser Deus, assumindo uma natureza humana igual à nossa em tudo, exceto o pecado.
Trata-se de um “presente”, um dom do Pai à Humanidade, tendo como resposta uma
terrível rejeição. Como registra o Evangelho de São João, “Ele veio para o que
era seu, e os seus não o acolheram”. (Jo 1,11.)
Se contemplamos a Paixão de Cristo,
vemos como Ele “rolou de mão em mão”, de Herodes a Pilatos, dos algozes aos
carrascos, com as vaias da turba e a zombaria dos soldados. Em todos estes
casos, mãos humanas. Humanas como as nossas, que também pecamos e, de certo
modo, confirmamos a morte do Senhor.
É bem verdade que Jesus passou por
outras mãos. As mãos santas de Maria, que o acariciaram. As mãos firmes de
José, que ajudaram o Menino a andar. As mãos impuras da hemorroíssa, que
tocaram a franja de seu manto, obtendo a cura de sua enfermidade crônica. As
mãos prestativas de Marta, que lhe preparavam a refeição. As mãos compassivas
do Cireneu, que sustentaram parte do peso da cruz. As mãos amigas de Nicodemos,
que embalsamaram o corpo de Jesus em mirra e aloés. As mãos trêmulas de Tomé,
que lhe tocaram as feridas.
Seremos ainda capazes de admiração e
espanto diante de um Deus que se entrega nas mãos de homens? Caso positivo,
olhemos para o altar: ali – em cada missa – Jesus Cristo se entrega de novo.
Sob as humildes aparências do Pão, é o mesmo Corpo que se entrega. Na figura
sensível do Vinho, é o mesmo Sangue que se derrama.
E nós? Quando nos entregaremos nas
mãos de Deus?
Orai sem
cessar: “Terei
confiança no Senhor!” (Is 8,17)
Texto de
Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
Nenhum comentário:
Postar um comentário