Dois
homens subiram ao Templo... (Lc 18,9-14)
O Templo de Jerusalém – o único
lugar do planeta aonde os israelitas se dirigiam para adorar o Senhor – ficava
no alto do Monte Sião, nas elevações da Judeia. Natural que o Altíssimo
habitasse as montanhas. Para encontrá-lo, era preciso subir...
Pelo menos, era o que pensava um dos
dois que entraram no templo, o fariseu. Membro do grupo dos perushim [os “separados”, que se apartaram
da massa ignara para não se misturaram aos impuros!], estrito cumpridor das
normas e preceitos do judaísmo, ele se sente realmente especial.
No espaço sagrado, ele sente
necessidade de subir até Deus: em seu íntimo, eleva-se diante do Senhor, ergue
os olhos, alça a voz e desfia uma lista de suas admiráveis qualidades, entre as
quais a prática do jejum (duas vezes por semana!) e o dever do dízimo. Ainda
teve tempo para confidenciar a Deus que não era “como os outros” – aos quais
classifica como ladrões, desonestos e adúlteros. Como o publicano lá no
fundo...
Lá no fundo, está claro. Lá em
baixo. Ao nível do chão. Este publicano – um judeu que cobra impostos ao
compatriota judeu e o repassa ao invasor romano! – sabe que está “lá em baixo”.
Desprezado, mal-visto, mal-falado, um marginal no povo de Deus. Por tudo isso,
não queria “aparecer”. Baixa a cabeça, baixa os olhos, colado ao piso do
Templo. E assim se apresenta ao Senhor: “Sou pecador. Tem compaixão.”
Mendigo da misericórdia, recebe a
esmola do perdão. Ao confessar sua injustiça, Deus o justifica. Aliás, não há
outra forma de ser “justificado”.
E Deus, qual o seu papel nessa
história? O beneditino François Trévedy no-lo revela: “Deus não diz nada. Para
o fariseu, ele ri baixinho, com seu riso eterno. Para o publicano, ele sorri, e
isto basta. E tu, que facilmente te consideras como cristão ‘engajado’, não
desprezes aqueles que permanecem no fundo da igreja e vêm pegar, muito mais
inquietos, muito mais sérios do que imaginas, um arzinho da missa. Conserva-te constantemente
no lugar mais recuado de ti mesmo, no inferno de ti mesmo, e a ternura de Deus
ali virá buscar-te para te dar a vida”.
Parece irônico, não? Temos insistido
em subir às alturas de Deus, ignorando a mísera realidade de nosso húmus,
quando ele próprio se despojou de toda humana grandeza, baixando para o rés de
nosso chão e assumindo livremente a posição de um escravo (cf. Fl 2,7). Com a
encarnação, o Altíssimo tornou inútil o nosso atletismo espiritual, pois a
verdadeira religião tornou-se um caminho para baixo. Quem tentar a comunicação
com Deus deverá abaixar-se também...
Orai sem cessar: “Tu não desprezas, ó Deus, um
coração contrito e humilhado!” (Sl 51,19)
Texto
de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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