Dois filhos... (Lc 15,1-3.11-32)
Sim, dois irmãos, dois filhos do
mesmo Pai. Penso na pequena fazenda do interior, onde o velho fazendeiro planta
a roça e cuida do gado. Nada muito grande, mas suficiente para produzir além do
necessário, com fartura e segurança. O Pai lembraria um patriarca: barbas
longas, a túnica comprida, as mãos magras, o olhar penetrante. Calmo, sereno,
amante de longos silêncios. Olha muito e fala pouco. Não me espantaria se os
dois filhos o considerassem um tanto misterioso...
São dois filhos. O mais velho é
sério, trabalhador, responsável. Sua a camisa de sol a sol para merecer o amor
do Pai. Trabalha mais que todos os empregados juntos! No fundo, teme cometer
algo errado que estrague sua imagem diante do Pai. Claro, para ele, o Pai
encarna a autoridade, a Lei, a norma e, ao mesmo tempo, a segurança, a
estabilidade, a herança. Quem permanecer fiel ao Pai, um dia receberá a
herança...
O filho mais novo é um
brincalhão. Alegre, jovial, o tipo de homem cordial que deseja muitos amigos,
sente falta de muitos abraços, festas e barulho. Talvez esteja à procura de
gente mais extrovertida e mais festiva que o velho Pai. Bem, convenhamos,
trabalhar não é com ele. Afinal, não vê muito sentido em dar duro para
trabalhar a terra, quando as coisas parecem estar sobrando: é tempo de vacas
gordas e o céu se derrete em goiabada!
Se o leitor ainda não pensou
nisso, pense agora: - Como se sente o mais velho, mourejando na gleba, enquanto
o caçula vive na flauta? Ciúmes, hein? Um tanto de raiva, não? Uma dose de
rancor? Não é injusta a situação? A qualquer momento o ódio toma conta de seu coração.
Só falta a gota d’água...
Pois não é que veio a gota
d’água? O irmãozinho playboy chega-se ao Pai e, de cara bem limpa, pede
a sua parte na herança. Notar que o Pai ainda vivia e, por isso, os herdeiros
não tinham direito a uma exigência desse quilate. Para espanto geral, o Pai
concorda. Vende parte da terra ou uma fração dos rebanhos e dá ao garotão o
terço (é que dois terços cabiam ao primogênito) da herança.
Dinheiro no bolso, cair na
gandaia! Lá se vai o caçula, em busca do amor que ainda não conhece. Concorda
comigo? Ele não sabe que o Pai o ama. Por isso deixa a casa do Pai. O mais
velho também não sabe que o Pai o ama. Por isso vive como escravo, tentando
comprar o amor do Pai com seu trabalho.
Se um dia o mais moço voltar para
casa, aposto que teremos problemas. Ainda mais se o Pai colocar o fogo do amor
paterno acima do gelo da lei patriarcal...
E você? O que pensa a respeito?
Orai sem cessar: “Meu povo me chamará: meu Pai!” (Sl 89,27)
Texto
de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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