Seu
coração está longe de mim... (Mc 7,1-8.14-15.21-23)
Culto,
ritos, tradições, minúcias doutrinais, preceitos humanos... Tudo isso pode ser
usado por nós como uma cortina de fumaça para tentar esconder a dura realidade:
nossa conversão está a meio do caminho. Ao citar o profeta Isaías (29,13),
Jesus contrasta o exterior (os lábios) e o interior (o coração). E é em nosso
íntimo que ele espera por mudança. Por conversão. Por arrependimento...
E
o que significa “arrepender-se”? A resposta nos vem de Kallistos Ware [1934-],
ex-monge do mosteiro São João, em Patmos, e bispo da diocese greco-ortodoxa de
Diokleia (Inglaterra):
“Esta
palavra [arrependimento] evoca, em geral, a pena por ter pecado, o sentimento
de culpabilidade, a sensação de pena e de horror diante das feridas que
infligimos ao nosso próximo e a nós mesmos. Mas tal visão é incompleta. Para
aproximar-se do sentido profundo do arrependimento, é necessária uma volta ao
termo grego ‘metanoia’. Literalmente,
‘mudança de espírito’. Não somente lamentar o passado, mas uma transformação
fundamental de nossa perspectiva, nova maneira de ver a Deus, ao outro e a nós
mesmos. O arrependimento não é um acesso de remorso e de piedade sobre si
mesmo, mas uma conversão, uma reconcentração de nossa vida sobre a Santíssima
Trindade.
Espírito
novo, conversão, reconcentração, o arrependimento é algo de positivo e não de
negativo. O arrependimento não é perda de ânimo, mas ardente expectativa; não o
sentimento de estar em um impasse, mas de ter achado uma saída; não ódio de si
mesmo, mas afirmação de seu verdadeiro ‘eu’ feito à imagem de Deus.
Arrepender-se não é olhar para baixo, para as próprias imperfeições, mas para o
alto, para o amor de Deus; não para trás, com as reprovações que nos fazemos,
mas para frente, com confiança. É olhar não aquilo que não conseguimos ser, mas
aquilo que ainda podemos vir a ser pela graça de Cristo.
O
caráter positivo do arrependimento aparece claramente nas palavras do profeta
Isaías (9,1), que o evangelista Mateus cita logo antes do convite de Cristo ao
arrependimento: ‘O povo que andava nas trevas viu uma grande luz, sobre aqueles
que permaneciam na região sombria da morte, uma luz se levantou’. Assim, o
arrependimento é uma iluminação, passagem da obscuridade para a luz.
Arrepender-se é abrir os olhos à irradiação divina; não demorar-se tristemente
no crepúsculo, mas acolher a aurora.”
Não
podia ser mais claro: o arrependido não se concentra na feiura do pecado
passado, mas na beleza da graça atual. Nada de espojar-se nas misérias antigas,
mas límpido mergulho no amor de um Deus que acolhe o filho extraviado.
Por
que não pedir a graça de uma sincera conversão?
Orai sem cessar: “Vou voltar para o meu Pai...” (Lc 15,18)
Texto de Antônio Carlos Santini, da
Comunidade Católica Nova Aliança.
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