Ouvirão a sua voz... (Jo 5,17-30)
Os
mortos? Sim, os mortos. A voz de Deus se dirige também àqueles que estão nos
túmulos (v. 28). Aliás, nada que devesse deixar-nos admirados, pois a 1ª Carta
de São Pedro registra que Jesus Ressuscitado desceu à mansão dos mortos – o
Xeol – para anunciar a Boa Nova também aos que já tinham morrido (cf. 1Pd 4,6).
Também eles tinham direito à oportunidade de aderir ao Salvador. E os ícones da
Ressurreição – a Anástasis – mostram
Jesus arrombando as portas do Xeol, derrotando o demônio e puxando Adão pelo
pulso, tirando-o de seu túmulo.
Cristo é
Senhor dos vivos e dos mortos! A voz de Cristo se dirige a todos eles. E se o
morto o ouve - Lázaro que o diga! – a passagem para a vida está à sua
disposição.
Sugiro,
porém, olhar em outra direção. Refiro-me aos “mortos” deste mundo. Por exemplo,
em cinco anos de serviço na Pastoral Carcerária, em um presídio de segurança
máxima, nossa equipe da Comunidade Católica Nova Aliança teve a oportunidade de
conviver com 900 presidiários. Eram ladrões, traficantes e assassinos. Aos
olhos da sociedade, estavam mortos e enterrados.
No
entanto, muitas vezes verificamos que continuavam sensíveis à palavra do
Evangelho: “Se eu tivesse ouvido isto antes, não estaria aqui hoje!” Era comum
ver lágrimas nos olhos dos presos que participavam dos encontros de
evangelização. Muitos se confessavam e passavam a comungar. Alguns manifestaram
o desejo de serem preparados para a primeira comunhão. Na capela da Casa de
Detenção, pudemos realizar o casamento de um presidiário que já convivia com
sua mulher. Na Comunidade, chegamos a receber visita de algum deles, já
libertado da prisão.
Estavam
mortos, mas ouviram a Palavra de Deus. Ninguém apostava neles, mas Deus ainda
tinha cartas na manga...
E
os demais “mortos”? São muitos: os drogados e traficantes, os fracassados aos
olhos do mundo, os favelados sem futuro, todos aqueles que foram descartados
pelo sistema. Foi por eles que Madre Teresa deixou a segurança de seu colégio
de ricos para levar o abraço de Jesus aos mendigos e leprosos de Calcutá.
“Não
se espantem”, escreve São João. “Vem a hora em que todos dos túmulos ouvirão a
sua voz.” (Jo 5,28) Nossa sociedade inoculada de desespero e ceticismo será
capaz de avivar esta chama de esperança? Estaremos dispostos a investir em
nossos mortos? Ou já cruzamos os braços diante do inevitável?
Orai sem cessar: “Senhor, a
tua promessa me faz viver!” (Sl 119,50)
Texto de Antônio Carlos Santini,
da Comunidade Católica Nova Aliança.
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