E Jesus dormia... (Mt 8,23-27)
Esta experiência dos discípulos no furor de uma
tempestade traz à luz a verdadeira natureza de nossa fé. Isto se esclarece se
aproximamos esta passagem daquela outra (Mt 6,25ss) que trata dos “cuidados
deste mundo.
Assim pensa Hébert Roux, que comenta:
“O sono de Jesus, sublinhado por Mateus – e objeto da
reprovação dos discípulos no Evangelho de Marcos! -, oferece forte contraste
com a fúria dos elementos desencadeados e o desespero dos discípulos. Mas ele
não significa que Jesus ignore ou desconheça a tempestade e a realidade do perigo
que os ameaça, assim como, na passagem sobre as aves do céu e os lírios do
campo, ele não negligencia a realidade de vida cotidiana.
De certo modo, o Jesus adormecido encarna a segurança da
fé. Ele evoca o sono do bem-amado do Eterno, de que nos fala o Salmo 127: o
sono de quem sabe que está protegido. E quando Jesus, a seguir, enfrenta a
tempestade, exatamente como diante dos doentes e dos demônios, ele age com a
calma e a decisão daquele que quer e pode, e a quem basta querer para poder. É
com a autoridade a ele dada por esse poder que Jesus pergunta aos discípulos:
‘Por que tendes medo?’”
Como se vê, o medo desmedido dos pobres discípulos tem
suas raízes precisamente no fato de não reconhecerem em Jesus aquele que quer e pode. Eles ainda não sabem quem é o seu Mestre. Sua ‘pequena fé’
[no texto grego, oligopistoi, isto é,
“minicrentes’!] situa-se no polo posto à fé do centurião (cf. Mt 8,8-10), o
soldado pagão que sabe bastar uma palavra de Jesus para que as coisas sejam
mudadas...
Chegaremos, um dia, a exercitar uma fé madura, capaz de
serenar nossos medos e mover nossos pés paralisados? Chegaremos a imitar o
salto no escuro de Teresa de Calcutá, que deixa a segurança do convento para
mergulhar no lodo das favelas. Ou de Damião de Veuster, que se oferece como
voluntário para pastorear um rebanho de leprosos?
A sociedade que nos envolve considera a insegurança como
um de seus maiores problemas. Grades de ferro, cercas de arame farpado e
aparatos eletrônicos denunciam seu medo permanente. Enquanto isso, os
missionários convivem com os presidiários, os drogados e os traficantes.
De onde brota o nosso medo?
Orai sem cessar: “Na hora do medo,
Senhor, em ti me refugio!” (Sl
56,4)
Texto de Antônio Carlos
Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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