Não devias
tu também? (Mt 18,21-35)
Nesta parábola, a pergunta do rei
supõe uma dívida. Dívida que é de todos nós. A dívida do perdão. Se fomos
perdoados à custa do sangue de Cristo, com que direito nos negaríamos a perdoar
nossos credores?
E não se trata de credores que
levaram nosso ouro emprestado, ou uns meros caraminguás que nem nos fazem
falta. São credores que nos humilharam, nos agrediram, nos assaltaram, nos
difamaram, nos violaram, nos traíram. E o rei insiste: “Não devias também tu
ter compaixão, como eu tive compaixão de ti?”
Segundo o comentário de Hébert
Roux, o ensinamento desta parábola lembra-nos qual é nossa situação diante de
Deus, que se esconde no “rei” da parábola contada por Jesus. É a condição de um
devedor em situação de insolvência. “Mesmo fazendo o inventário de todos os
valores que representam sua pessoa e seus bens, o servidor sabe que não poderá
satisfazer às exigências de seu senhor, a despeito de suas promessas.”
O servidor sem fundos para cobrir
a dívida impagável devia sua liberdade tão somente a um decreto real de pura
“graça”. É a Graça divina que liquida nossas faturas, não as nossas boas ações,
nem nossos eventuais méritos, geralmente nascidos de nossa imaginação
autopiedosa. E a indignidade do servo perdoado cresce aos nossos olhos quando
ele se recusa a perdoar uma dívida insignificante, se comparada à sua própria.
“Aqui – observa H. Roux – Jesus
coloca em termos concretos o grande problema da moral cristã, que se tornará um
dos temas essenciais da pregação apostólica: ‘Conduzi-vos de maneira digna do
Evangelho...’ (Fl 1,27) ‘Revesti-vos do homem novo criado à imagem de Deus...’
(Ef 4,23) ‘Tornai-vos imitadores de Deus...’ (Ef 5,1) Em lugar de imitar seu
senhor, o servidor impiedoso se comporta em relação a seu companheiro
exatamente como o rei não quis comportar-se com ele.”
O mesmo autor vai estender sua
reflexão, afirmando que a graça que recebemos deve ser geradora de uma vida
nova, ou não será graça. Deve marcar o início de uma vida nova, e não o fim de
nossas relações com Deus. Não admira, pois, que o “amarás ao Senhor, teu Deus”
venha inseparavelmente jungido ao “amarás a teu próximo”. Dois mandamentos que
formam dois braços de uma cruz: a relação vertical com Deus e a relação
horizontal com nosso próximo.
Claro, quem não se sente perdoado
terá dificuldade em perdoar. Quem se declara justo diante de Deus será sempre
um juiz impiedoso... O mundo pagão é implacável!
Orai sem cessar: “Eu quero
misericórdia, e não sacrifícios...” (Os
6,6)
Texto
de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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