quinta-feira, 31 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Ficai preparados! (Mt 24,42-51)
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            Entre aqueles que se dizem fiéis, em especial os que se creem “renovados no Espírito”, penso encontrar mais gente apressada em servir o Senhor do que servidores à espera dele. É como se eles pudessem agir por conta própria... Ficaria o Senhor dispensado de intervir em nossa história?

            De fato, é mais fácil tomar iniciativa e fazer alguma coisa do que, humildemente, esperar que o Senhor entre em campo e dê o pontapé inicial da partida. Um notável mestre espiritual do Séc. XX, Lev Gillet, merece nossa meditação:
            “Felizes aqueles que seguem e sabem aonde vão! Felizes aqueles cujo passo é apressado e veem o caminho que conduz ao Reino! Mas também são felizes aqueles que esperam, os que chamam pelo Senhor, os que ignoram a hora de sua vinda e não cessam de clamar: ‘Vem! Vem! Vem ainda curar, perdoar, consolar, salvar!’
            Feliz aquele cujo olhar acompanha todos os olhares do Senhor sobre o mundo e, ao mesmo tempo, não pode desviar seu olhar da face de seu Senhor! Naqueles que seguem e nestes que esperam, já começa a Segunda Vinda. Acontece, já, a irrupção do Rei nas almas e no universo.
            Não será que nós percebemos mais facilmente a graça do seguimento que a graça da espera?
            A espera do Senhor não é estática. Ela não é um repouso. Toda verdadeira espera pelo Senhor implica uma transformação. A espera pelo Senhor é uma erradicação. Ela nos arranca de nosso terreno, de nosso meio. Ela nos desenraíza. Ela nos isola. Já não vemos mais como os outros, porque nossa visão atinge mais longe. Eles não sabem, não esperam. Mas se ocorre que os outros esperem conosco, esperem por Aquele que esperamos, então a mesma espera cria entre os corações a comunhão mais íntima.
            A espera pelo Senhor não apenas priva de seu valor as coisas diferentes daquelas que esperamos, mas ela nos toma o próprio momento presente. De fato, o que nos interessa não é aquilo que é o momento presente. O que esperamos, o que nos interessa de modo supremo, é Aquele que o instante nos traz, é a chegada e o contato do Senhor neste instante.
            Somente aquele que espera pelo Senhor é capaz de apreciar o instante presente, conhecer sua significação e riqueza. É que ele sabe situar este instante em sua exata perspectiva. Ele sabe coordená-lo à vinda do Senhor. A espera lhe abre os olhos e lhe faz ver os homens e o mundo tais como são em sua realidade profunda.”
            Este é o servo que receberá a administração dos bens do Senhor (cf. Mt 24,47). Com a espera, ele despertou do sono e já não confunde as ilusões com a realidade. Ele é feliz...
Orai sem cessar: “Mais que as sentinelas a aurora, Israel espere pelo Senhor!” (Sl 130,6-7)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 No tempo de nossos pais... (Mt 23,27-32)
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            Neste Evangelho – uma espinhosa coleção de mal-aventuranças iniciadas por sete “ais” que prenunciam desgraças – o Mestre verbera a hipocrisia das lideranças religiosas de Israel, trazendo à tona as graves contradições entre pequenos ritos e grandes infidelidades, higiene exterior e íntima podridão, copos limpos e almas imundas...

            Um dos exemplos citados por Jesus é a habitual atitude de acusar os antepassados por seus erros (como o assassinato dos profetas, no caso de Israel) e julgar-nos superior a eles, como se não estivéssemos envolvidos em crimes semelhantes.
            Em geral, os filhos costumam alimentar mágoas e ressentimentos em relação aos pais. São frequentes as queixas e acusações. Modernos que somos, não conseguimos evitar um sorriso de ironia diante das “ignorâncias” dos antepassados. Muitos casais de hoje escolheram como lema a frase: “Não queremos que nossos filhos passem aquilo que passamos”. Claro, a culpa é dos antigos...
            Ora, somos melhores que eles? Somos capazes dos sacrifícios que eles assumiram em uma época de grandes carências materiais e duros combates pela sobrevivência? Estamos repetindo seus gestos de desapego, como aquelas mães que tiravam de seu prato a comida dos filhos? Temos as mãos calejadas para que nossos descendentes tenham seu diploma?
            Eram tempos difíceis. Não havia luz elétrica nem água encanada. Tempos de lamparina de querosene, de buscar água na bica. Tempos de comprar roupa nova apenas quando a velha apodrecia. Tempos de meia-sola nos sapatos. E as vovós a declamar: “Remenda o pano, que dura mais um ano; remenda outra vez, que dura mais um mês”...
            Eram tempos de fé manifesta em pequenos gestos. A oração antes da refeição. A família reunida para rezar o terço antes de dormir. O dia pontuado pelo tradicional “bênção, mãe” e pelo “Deus te abençoe, meu filho!”
            Outro engano cometido por nós acontece quando comentamos: “Hoje é muito difícil ser cristão. Se eu tivesse vivido no tempo de Jesus, teria sido mais fácil!” Na verdade, é exatamente o contrário. A proximidade com a realidade humana de Jesus, sua família humana, a oficina do carpinteiro e – acima de tudo – sua escandalosa morte na cruz foram sérios obstáculos para que o acolhessem como Messias Salvador. Hoje, após vinte séculos de evangelização, após uma legião de mártires, após a reflexão dos grandes mestres espirituais, após os exemplos admiráveis de tantos servos e ervas de Deus, nossa fé tem muito mais andaimes para se apoiar.
            Por tudo isso devemos sentir-nos pressionados a buscar uma sincera conversão e dedicar todo o nosso esforço em cooperar com a Graça, que nos chama a abandonar nossas máscaras e centrar nossa vida na edificação do Reino de Deus. Este é o nosso tempo...
Orai sem cessar: “Senhor, meus tempos estão em tuas mãos!” (Sl 31,16)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

terça-feira, 29 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

A mulher do teu irmão... (Mc 6,17-29)
Imagem relacionada            Herodes Antipas, rei da Galileia e da Pereia, casado com a filha de um rei da Arábia, tomou também Herodíades, a mulher de seu irmão Herodes Filipe, que caíra em desgraça perante as autoridades romanas, e fez dela a sua concubina. Em sua pregação no Jordão, quando convidava o povo à conversão, preparando-se para a chegada do Reino de Deus, João Batista denunciava também a conduta imoral do rei, provocando a ira da concubina. Temendo a reação do povo, Herodes mandou prendê-lo.

Admirável a coragem e a santa ousadia do Batizador, acusando a corrupção do poderoso, mesmo com o risco de sua própria vida. Agindo assim, João Batista se colocava na mais legítima linha de denúncia profética do Antigo Testamento, trilhando os passos de Isaías, Jeremias e Amós, tantas vezes perseguidos e denunciados como perturbadores da ordem pública,
Hoje, a Igreja também assume uma estatura profética, quando defende os valores do Evangelho e tem a coragem de se postar na contramão do mundo que vai retornando ao primitivo paganismo. Ao condenar o aborto e a eutanásia, ao recusar o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a dissolução do matrimônio cristão, a Igreja demonstra sua fidelidade à Palavra de Deus.
Acusada de retrógrada e conservadora, na verdade a Igreja defende uma moral “nova” – aquela moral que veio com a pregação do Evangelho e provocou a admiração e a conversão das nações pagãs. Ao contrário, quem caminha para trás, merecendo o rótulo de retrógrados - são aqueles que pretendem “direitos” que as tribos antigas já exercitavam no paganismo, antes de sua evangelização: o “direito” de eliminar crianças defeituosas, assassinar anciãos incômodos e tratar a mulher como objeto de posse.
O Papa João Paulo II, com suas encíclicas de conteúdo moral (como Veritatis Splendor e Evangelium Vitae), é um exemplo recente da luta da Igreja na defesa da verdade e da vida, orientando toda a sociedade para a retomada de uma reflexão sobre os aspectos éticos de nossa existência. Mesmo em ambientes não-cristãos, erguem-se vozes de peso que clamam por uma reforma moral da sociedade.
Ao celebrar o martírio de São João Batista, nós devemos tomar consciência de que a vivência integral do Evangelho certamente há de causar-nos problemas em uma sociedade que se paganiza de novo. Mais que um intermediário para nossas preces, João é um modelo a ser imitado.
Nos ambientes em que vivo e convivo, tenho a coragem de defender os valores do Evangelho? Ou me calo diante da pregação do ateísmo e da libertinagem de costumes?
Orai sem cessar: “Preparai o caminho do Senhor!” (Mt 3,3)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Infelizes de vós! (Mt 23,13-22)
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           No Sermão da Montanha (Mt 5,1-11), Jesus pronunciou nove bem-aventuranças, isto é, nove anúncios de ventura e felicidade para certos tipos de pessoas, uma autêntica “receita de felicidade”. Entretanto, até onde eu entendo, muita gente não gostou dessas bem-aventuranças, em que o Mestre elogia os pobres, os perseguidos, os que choram. Parece que a noção terrena de felicidade deve incluir riqueza, aplausos e muitas gargalhadas...

            Desta vez, Jesus se volta para o polo oposto e emite sete “mal-aventuranças”, até para deixar claro que o Deus misericordioso não fica neutro e indiferente diante do mal. O foco destas “maldições” recai sobre a falta de correspondência entre uma religião exterior, fingida, e uma vida interior que desmente toda a aparência de justiça. Este descompasso entre intenção e gesto é conhecido como “hipocrisia”.
            Nas cidades helenizadas da Galileia, ainda no tempo de Jesus, havia arenas onde os atores representavam seus papéis com o rosto coberto por máscaras. Esta é a etimologia da palavra “hipócrita” = aquele que está sob a máscara. É claro que o ator podia estar usando a máscara cômica e, no fundo de seu ser, estar triste. Ou estar chorando por fora, graças à máscara trágica em seu rosto, sem sentir nenhuma dor, nenhum “pathos” interior.
            Só que o culto a Deus não pode ser um teatro. Neste Evangelho, Jesus verbera aquelas lideranças religiosas de seu tempo que exibem uma prática externa de religiosidade, mas o íntimo delas cheira mal pelo pecado e pela mentira.
            Assim comenta Hébert Roux esta passagem do Evangelho de Mateus:
“Toda a verdade e autoridade destas palavras brotam do fato de que elas são pronunciadas pela própria boca daquele que fez ouvir o Sermão da Montanha. Jesus vem como Rei do Reino dos céus, proclamando pessoalmente a Boa Nova, e vem também como Juiz supremo dos vivos e dos mortos, a pronunciar a condenação de toda pretensão dos homens a serem justos fora da Sua justiça.”
Para H. Roux, Jesus não tem a intenção de provocar um “retorno” dos escribas e fariseus, pois eles já perderam a oportunidade de acolher o Messias. Chega a hora em que as “intenções e ações secretas” (cf. Rm 2,16) serão julgadas por Jesus Cristo. Assim, “por antecipação – afirma Roux -, estamos assistindo de algum modo ao juízo final, à revelação daquilo que estivera oculto até o presente”.
O Evangelho tem esta faculdade: revelar a verdade e, com a palavra-espada, cortar bem na linha divisória entre a verdade e a mentira. A ruína total de Jerusalém, sob o impacto das legiões romanas no ano 70, apenas viria a confirmar a urgência desse julgamento.
            E nós? Vamos esperar pelo juízo final para abandonar a mentira e abraçar a Verdade?
Orai sem cessar: “Escolhi o caminho da verdade!” (Sl 119,30)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

domingo, 27 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Não prevalecerão! (Mt 16,13-19)
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Natural que a Igreja, continuando a missão de Jesus, viesse a enfrentar a mesma hostilidade. Ele advertira: “No mundo tereis aflições. Coragem! Eu venci o mundo.” (Jo 16, 33.) Mas temos a promessa de Jesus que mantém firme nossa esperança. Ao proclamar o primado de Pedro, Jesus diz: “E eu te digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.” (Mt 16, 18.) Nos muros da cidade, a “porta” é importante elemento nas guerras primitivas. Se ela resiste aos ataques do invasor, os defensores estão seguros.
            Ao longo da História, a Igreja foi cercada de inimigos ferozes. Perseguida por césares romanos e sultões orientais, seus fiéis foram caçados, exilados, condenados aos campos de concentração. Muitos exércitos invadiram Roma. Todos eles – tribos bárbaras, tropas napoleônicas, tanques nazistas – foram aniquilados a seu tempo, e a Igreja de Cristo permanece de pé. Hoje, a hostilidade dos inimigos mudou de tática. Mesmo sob os véus diáfanos da democracia, da liberdade de culto e do pluralismo ideológico, a Igreja ainda é o alvo preferencial do anticristo. Setas e obuses foram trocados por páginas de revistas e telas de TV. Ali, uma enxurrada de calúnias e de meias-verdades ainda visa à destruição do Corpo de Cristo, que é a Igreja.
            Natal de 2005, o locutor da TV Globo lê notícia sobre pesquisas terapêuticas com células-tronco. Finda a nota, olha para a câmara e acrescenta breve comentário: “A Igreja Católica não admite as pesquisas com células-tronco.” E o telespectador iludido vê a Igreja como uma entidade conservadora, inimiga da humanidade. Só que o comentário era falso. A Igreja se opõe ao uso de embriões humanos para tais pesquisas, mas admite o uso de tecido umbilical e de outras fontes. Mas o alvo já fora atingido...
Orai sem cessar: “Tuas muralhas estão constantemente sob os meus olhos.” (Is 49, 16)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

sábado, 26 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Quem se exaltar será humilhado... (Mt 23,1-12)
Resultado de imagem para (Mt 23,1-12)           Aqui e ali, Jesus acena para o caminho da humildade. Ele mesmo, o humilde exemplar, sendo Filho de Deus, vive por 30 anos uma vida banal, conhecido de todos como “o filho do carpinteiro”. Na Última Ceia, de avental, lavou os pés dos apóstolos. Por tudo isso, por Jesus viver o que ensina, não podemos ignorar o seu ensinamento.
            Os Padres da Igreja sempre insistiram na virtude da humildade como essencial para o itinerário cristão. É de um deles – São João Clímaco [Séc. VII] – o comentário que segue:            “Todo amigo da ostentação é vaidoso. Presta atenção e tu verás que, até o túmulo, a vanglória se multiplica, seja nas vestes, nos aromas, no cortejo dos servidores ou em outras coisas.
A vanglória torna orgulhosos aqueles que são honrados, e faz rancorosos os que são deixados de lado. Um espírito elevado suporta a injúria com coragem e alegria. Mas é preciso ser um santo e um bem-aventurado para passar sem prejuízo através de louvores.
            Com frequência, Deus esconde aos nossos olhos as virtudes que adquirimos. Mas aquele que nos elogia, ou até nos engana, abre nossos olhos para seus louvores e, quando nossos olhos se abrem, nosso tesouro se dissipa.
            Não confies no tentador que te sugere fazer propaganda de tuas virtudes para a edificação do próximo. Nada edifica tanto os outros quanto as maneiras humildes e sinceras e as palavras verdadeiras, pois isto os ajuda a jamais se orgulharem.
            Não é aquele que se deprecia o que dá provas de humildade, mas aquele que, ofendido por alguém, não permite que diminua seu amor por ele.
            Quando nossos aduladores, ou antes, nossos sedutores começam a nos louvar, devemos trazer à memória a multidão de nossos pecados, e iremos reconhecer-nos indignos daquilo que se diz ou se faz em nossa honra.
            O jejum do vaidoso fica sem recompensa, e sua oração, sem proveito, porque ele realiza as duas coisas para ser elogiado pelos homens. O sol brilha para todos igualmente, e a vanglória acha um meio de aparecer em todas as nossas atividades.
            O vaidoso é um crente idólatra: parece que ele honra a Deus, mas ele busca agradar aos homens, e não a Deus. É certo que, às vezes, os vaidosos dirigem a Deus orações que merecem ser atendidas, mas o Senhor tem o hábito de ignorar suas preces e pedidos, temendo que, ao verem atendidas as suas orações, eles aumentem ainda mais o seu orgulho.
            O Senhor muitas vezes liberta os vaidosos da vanglória por meio de alguma humilhação que acontece com eles.”
            Em tempo: “humilde” vem de “húmus”, aquela argila na qual fomos amassados...
Orai sem cessar: “O Senhor ampara os humildes.” (Sl 147,6)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 O maior mandamento... (Mt 22,34-40)
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Existe uma gradação no amor? Bem, ao menos devemos hierarquizar as normas, as leis e os mandamentos. Há coisas que estão no âmago da Lei, no coração da vida espiritual. Há outras são corolários, consequências das primeiras.
Mesmo que o questionamento feito a Jesus, no Evangelho de hoje, tenha sido mero pretexto para “pegá-lo” em uma arapuca doutrinária, pelo menos valeu para que aprendamos bem sua lição. Existem dois amores que se fundem num só: o amor a Deus e o amor ao próximo.
            Se amamos a Deus, por isso mesmo não podemos deixar de amar aqueles que ele ama, criados à sua imagem e semelhança. Por outro lado, se amamos os nossos amados (pai e mãe, filhos, irmãos, amigos, benfeitores da humanidade etc.), como não amar também seu Criador? Nossos amados são sempre um dom que Deus nos oferece para dar sabor e alegria à nossa caminhada na terra.
            A coisa fica incômoda quando o “próximo” não nos parece próximo... Aquele mendigo que bate à nossa porta, o bêbado caído na calçada, o adversário na política, o membro de outras Igrejas que nos acusa de idolatrias e outros pecados...
Como nos aproximar deles, ultrapassando os largos fossos e as altas muralhas que se foram acentuando ao longo dos séculos? Como gastar nosso azeite e nosso vinho para cuidar de suas feridas, tal como fez o samaritano da parábola (cf. Lc 10,30ss). Como chegar a esse “amor impossível”?
            Além do mais, o mandamento repetido por Jesus inclui uma cláusula assustadora: “amarás a teu próximo COMO A TI MESMO”. Tal como desejo manter a minha vida, como busco por segurança e conforto, e fico feliz quando alguém se ocupa de mim, é assim mesmo que deveria proteger a vida do próximo, zelar por sua segurança e gastar com ele tempo e dinheiro...
            Utopia? Pode parecer, quando se vive em uma sociedade fechada em si mesma, atrás de muros e cercas elétricas. Quando o individualismo e a ânsia de acumular petrificam nosso coração. Quando a pobreza e a sobriedade deixam de ser virtudes para se tornarem uma desgraça...
            No entanto, exatamente em nosso mundo – com seus crimes e defeitos – ainda há pessoas cheias de amor que adotam crianças abandonadas, cuidam de idosos carentes, lutam pela defesa do ambiente e dos direitos humanos. Assim, enquanto houver um único santo sobre a terra, não teremos desculpas para não amar...
Orai sem cessar: “Oh! como é bom e agradável
                        irmãos unidos viverem juntos!” (Sl 133,1)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 De onde me conheces? (Jo 1,45-51)
Resultado de imagem para (Jo 1,45-51)           Ao fazer esta pergunta, Natanael (também chamado Bartolomeu) não podia imaginar que estava diante do Filho de Deus que se encarnara. Se soubesse disso, não faria a mesma pergunta. Como um bom israelita (v. 47), ele conhecia as Escrituras que falam do conhecimento que Deus a nosso respeito.

            Trata-se de um “conhecimento” anterior a nossa própria fecundação: o Deus eterno é também onisciente, aquilo que chamamos de futuro é para Ele um eterno presente. Não foi o que declarou Jeremias? “Veio a mim a Palavra do Senhor: ‘Antes de formar-te no seio de tua mãe, eu já te conhecia; antes de saíres do ventre, eu te consagrei e te fiz profeta para as nações’.” (Jr 1,4-5)
            Também o salmista foi iluminado a respeito do íntimo conhecimento que Deus tem sobre a pessoa humana:
            “Senhor, tu me examinas e me conheces,
sabes quando me sento e quando me levanto.
Penetras de longe meus pensamentos [...]
Sabes todas as minhas trilhas.
Tu me conheces por inteiro.
Não te eram ocultos os meus ossos
quando eu estava sendo formado em segredo,
e era tecido nas profundezas da terra.
Ainda embrião, teus olhos me viram.” (Sl 139,1-3.14-16)
            O profeta Isaías confirma tudo isto: “Desde o seio materno, o Senhor me chamou; desde o ventre de minha mãe, já sabia o meu nome”. (Is 49,1b)
            Sendo tão claro e profundo o conhecimento que Deus sobre nós, conhece em detalhes nossas fraquezas, nossas feridas, nossos pecados. E quanto mais feridos estamos, mais se excita a sua misericórdia, mais se manifesta o seu amor. É a afeição do bom Pastor pela ovelha machucada.
            Devemos concluir que é pura insanidade, de nossa parte, todo movimento de fuga, toda tentativa de ocultar ao Senhor a nossa realidade pessoal, mesmo os pensamentos mais íntimos e as intenções mais inconfessáveis.
            E por falar em “in-confessável”, como entender a dificuldade em confessar nossos pecados a um Deus que é Pai e já conhece previamente todos os nossos erros e fracassos? Aliás, como ensinou o Filho, há mais alegria nos céus por um só pecador que volta para casa, do que por noventa e nove justos que não precisam regressar (cf. Lc 15,7).
Orai sem cessar: “Senhor, sabes tudo de mim!” (Sl 139,2)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Vende todos os bens... (Mt 13,44-46)
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            Nós já meditamos muitas vezes sobre estas miniparábolas de Jesus. A densidade delas, no entanto, jamais se esgotará diante de nossa humilde reflexão. Ambas falam de um “achado”, de um “encontro” capaz de virar de cabeça para baixo a existência de quem tem a graça de experimentá-lo.

            É curioso que as duas parábolas nos mostrem diferentes situação: enquanto o negociante estava determinado a procurar por pérolas preciosas, ou seja, tinha uma intenção prévia, já o tesouro do campo foi encontrado por alguém que não o procurava. Puro acaso, diria alguém; pura graça, digo eu. Total iniciativa de Deus que – ele sim! – jamais se cansa de procurar por nós.
Especialmente nestes tempos de um relativismo tão profundo, que chega a se tornar cinismo, este Evangelho nos coloca implacavelmente diante do “absoluto”. Existe alguma coisa que realmente valha a pena? Algo que justifique revirar a própria vida, abrir mão de tudo que nos seduzia até então e, para adquiri-lo, dar em troca todos os tesouros que passamos a vida a acumular?
            Alguém diria que esta descoberta redunda em “perda” e prejuízo, pois acaba por desvalorizar a vida pregressa e toma da pessoa as velhas seguranças, os seus referenciais e os pontos de apoio. Pois é isto mesmo: a tal “conversão” realiza exatamente isto. Só que não se trata de “prejuízo” quando se ganha a ALEGRIA, esta moeda rara que não se compra com dinheiro, com sucesso e com poder. A alegria inefável que enche a alma, ilumina o espírito e chega a acelerar os batimentos cardíacos. Uma experiência totalizante...
            Nas palavras de Hans Urs von Balthasar, “aquele que compreende o valor do que Jesus lhe oferece, não hesitará em se despojar de todos os seus bens, em se tornar um pobre em espírito (isto é, aquele que, em sua disposição de espírito, a tudo renuncia), pois deles é o Reino dos Céus”.
            As duas parábolas nos ensinam que a prudência calculista do mundo dos negócios e das finanças é incompatível com a alegria de quem descobre o absoluto de Deus. Basta ler a vida de Francisco de Assis, de Inácio de Loyola, de Teresa de Calcutá, para entender o “bom negócio” que eles fizeram ao trocar as suas seguranças – dinheiro, glória, conforto – pelo arriscado mergulho em Cristo, que a tantos continua assustando...
            Um tesouro que vale a vida não pode ser algum tipo de acumulação que fique “do lado de cá” quando nós passarmos para “o lado de lá”. Esta consideração sobre “os fins” (os teólogos falam de vida escatológica...) e sobre a efemeridade dos tesouros materiais devem abrir nossos olhos e reorientar nosso itinerário neste mundo.
Orai sem cessar: “Senhor, deste mais alegria ao meu coração...” (Sl 4,7)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 O Senhor está contigo! (Lc 1,26-38)
Resultado de imagem para (Lc 1,26-38)           Por quase doze anos, preguei o Evangelho em uma capelinha dos Vicentinos, no bairro Ipiranga, em Belo Horizonte. Atrás do altar, na parede, havia dois pequenos nichos com imagens: de um lado, Santa Helena, a rainha; de outro, Santa Zita, a empregada doméstica. Na primeira imagem, a coroa na cabeça. Na segunda, o balde na mão. Bastavam as duas imagens para apontar a missão da Igreja: servir para reinar...

            Hoje, a liturgia da Igreja celebra a memória de Nossa Senhora Rainha. O Evangelho escolhido registra uma cena capital na história da salvação: o momento da Encarnação do Verbo em Maria, quando Gabriel, mensageiro de Deus, traz a proposta que a Virgem acolhe da forma mais completa. Em uma frase densa e sem floreios, Maria adere ao convite divino: “Eis a escrava do Senhor... Faça-se em mim...” O “fiat” da versão latina traduz um verbo grego no modo optativo [genoito], para expressar não apenas uma atitude passiva diante da iniciativa do Espírito Santo, mas o desejo de colaborar com ele. Assim, Maria compromete toda a sua pessoa com o desígnio de Deus.
            Desde já, o divino e o humano entram em comunhão. Se, um dia, a mulher cooperara para a queda do gênero humano (cf. Gn 3), agora a Mulher colabora para sua regeneração. O Criador permanece o mesmo, mas a criatura, insuflada pelo Espírito, mostra-se inteiramente outra. O Filho da Mulher é o Filho de Deus e, com isso, formamos uma só família real.
            Como ensina Santo Tomás de Aquino, “o mistério da Encarnação não se realizou porque Deus, de alguma maneira, foi tirado do estado em que estivera eternamente, mas porque se uniu de uma nova maneira à criatura, ou antes, uniu-a si”.
            Maurice Zundel faz uma observação notável: “À grande recusa de amor que cobriu de trevas o esplendor das origens, a esse desvio capital, a essa conversão do homem para si mesmo que desloca sua unidade, desagregando todas as potências de seu ser, a este orgulho que o descentra, o exterioriza e o materializa, entregando-o a todos os assaltos do mundo exterior e submetendo-o a todas as fatalidades da matéria, o Amor, cuja amplitude não pode ser restrita por nossas falhas, vai opor esta nova criação que ora se realiza no seio da Virgem: a Humanidade, toda desapropriada de si mesma, que gravita no campo da Divindade, a Humanidade que tem seu Eu em Deus, em um perfeito teocentrismo, a Humanidade que subsiste no Verbo como o sacramento vivo da Palavra eterna, a Humanidade sagrada de nosso Senhor, Jesus Cristo, ‘que está acima de tudo, o Deus bendito para sempre’ (Rm 9,5)”.
            Somos inseparáveis de Deus. A Mãe do Rei é inseparável de seu Filho. É como Rainha que ela vem servir...
Orai sem cessar: “Entra com todo esplendor a Filha do Rei...” (Sl 45,14)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Que devo fazer? (Mt 19,16-22)
Resultado de imagem para (Mt 19,16-22)            Neste Evangelho, um jovem rico se aproxima de Jesus com uma pergunta aparentemente prática, bem na linha dos modernos pragmatismos: “Que devo FAZER para ter a vida eterna?” A resposta de Jesus dá a entender que um judeu fiel, conhecedor das Escrituras, já deveria ter encontrado a resposta. Por isso mesmo, o Mestre o remete às Palavras do Sinai, que conhecemos como os Dez Mandamentos.

            A mesma coisa costuma acontecer conosco: ficamos perguntando a Deus aquilo mesmo que ele já nos disse muitas vezes, seja pela boca dos profetas, no passado remoto, seja pela voz de Jesus, no Evangelho de cada domingo. Seríamos distraídos? Ou nos fazemos de desentendidos?
            Hébert Roux observa que Mateus é o único evangelista a precisar que se tratava de um “jovem”, o que pode esclarecer a situação. De fato, os mais velhos podem cair facilmente na rotina e viver uma vida descansada (até das coisas de Deus!), toda apoiada em seguranças humanas. Os jovens, ao contrário do que se diz por aí, são sedentos de coerência, vivem na busca de algo “que valha a pena” – o que pode explicar o crescente desinteresse dos jovens por uma carreira, um diploma, em empreguinho seguro...
            O mesmo comentarista comenta a atitude do jovem: “De fato, sua pergunta revela a necessidade do absoluto e a busca pelo sentido da vida, como é característico da juventude. Mas, enquanto este jovem vem a Jesus impelido pelo que lhe falta (Que me falta ainda?), com a esperança de descobrir uma regra de perfeição moral superior ao que ele julgava já conhecer, o Mestre se limita a colocá-lo diante dos mandamentos bem conhecidos da segunda tábua do Decálogo”.
            Com isso, Jesus inverte a situação. O “algo bom” que o jovem queria conhecer, para o pôr em prática, não era uma ideia ou um padrão moral. “Bom” é o que Deus é, quer e faz. Assim, o caminho concreto (e não o segredo abstrato) está em centrar a própria vida em Deus e fazer dele o seu absoluto.
            Claro, o jovem perguntador diz que sempre cumpriu os tais mandamentos, mas ainda sente um vazio dentro de si. É que não basta cumprir os mandamentos de modo legalista, como quem aplica um manual, enquanto o coração permanece preso a outros bens, que acabam por se tornar ídolos em permanente competição com o próprio Deus. Jesus lê o coração do jovem, ama-o e quer que ele seja feliz. Daí, o conselho salvador: “Vai, vende os teus bens, dá o dinheiro os pobres e terás um tesouro no céu”.
            Afinal, como ensinou o próprio Jesus, “onde está o teu tesouro, aí está o teu coração”. (Mt 6,21)
Orai sem cessar: “Senhor, faz-me viver segundo o teu amor!” (Sl 119,88)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

domingo, 20 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Mãe do meu Senhor... (Lc 1,39-56)
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            Nesta solenidade da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria aos céus, elevada e assumida por Deus em corpo e alma, a Santa Igreja atualiza antiga tradição que remonta ao Século VI, quando a liturgia bizantina já celebrava a festa da “Dormição da Mãe de Deus” [em grego, “koimésis tes Theotókou”].

Diferentemente da visão artística ocidental, os ícones litúrgicos do Oriente mostram os apóstolos reunidos em torno do ataúde de Maria, enquanto, em segundo plano, Jesus Cristo abraça a alma da Virgem Mãe, sob a forma de uma criança de colo. No alto, em um medalhão, cercada de anjos, Maria, viva, sobe aos céus.
            Desde o Concílio de Éfeso [431 d.C.], ao condenar a heresia de Nestório, a Igreja reconheceu a Virgem Maria como “Mãe de Deus” – “não porque o Verbo de Deus tirou dela sua natureza divina, mas porque é dela que ele tem o corpo sagrado dotado de uma alma racional, unido ao qual, na sua pessoa, se diz que o Verbo nasceu segundo a carne”. Aliás, a Igreja sempre ensinou que toda a grandeza da Virgem Maria deriva de sua missão única, ao ser escolhida por Deus para gerar na carne o Salvador.
            Como Evangelho para a liturgia da solenidade de hoje, a Igreja escolheu o episódio da Visitação a Isabel. Esta, cheia do Espírito Santo, ao receber a visita de Maria, pergunta: “De onde me vem esta honra de vir a mim a Mãe do meu Senhor?” Ora, o Senhor de Isabel, filha do povo de Israel, era Adonai, o único Deus. Assim, quando a Igreja invoca a Maria com o título de Mãe de Deus, reconhece o seu papel insuperável na encarnação da Segunda Pessoa da Trindade, por obra do Espírito Santo.
            De fato, a Bem-aventurada Virgem Maria é a ponte (S. Bernardo de Claraval usava o termo “aqueduto”) pela qual Deus se uniu à humanidade. Jesus Cristo, ao mesmo tempo Deus verdadeiro e Homem verdadeiro, unindo duas naturezas – humana e divina – em sua única Pessoa, realiza em si mesmo a antiga promessa de uma Aliança definitiva entre Deus e os homens. A partir de sua encarnação, a família humana entrou em consórcio com a Família divina. Assim, o Pai do Filho é nosso Pai. O Filho é nosso irmão. O Espírito do Pai e do Filho habita em nós.
            E Maria é a Mulher especial, preparada por Deus para sua insigne missão. Como espelho e modelo da Igreja, a Mãe de Deus nos ensina e nos anima a ser ponte entre Deus e a humanidade, gerando Cristo para o mundo de hoje e estendendo pontes entre o Senhor e todos os povos e nações. Depois de tudo isso, a Virgem Mãe tem plena razão ao exclamar: “O Senhor fez em mim maravilhas!”
Orai sem cessar: “Bendito é o fruto do teu ventre, Jesus!” (Lc 1,42)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

sábado, 19 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Não as impeçais! (Mt 19,13-15)
Resultado de imagem para (Mt 19,13-15)            A cena é banal, à primeira vista: um rápido instantâneo do cotidiano gravado em apenas três versículos. As mães levam seus pequenos até Jesus para receberem sua bênção. Os discípulos tentam enxotar as crianças. E o Mestre reage com um imperativo: “Não as impeçais!”

            Bem intencionados, os discípulos? Talvez. O Mestre podia estar cansado. Aliás, estava de saída (cf. v. 15). Mesmo assim, a “bronca” permanece. Jesus quer as crianças junto de si. Ele ama os pequeninos.
            Sim, todos sabem: criança faz barulho, criança dá trabalho, criança “enche”... Não é à toa que os casais fazem tudo para “evitá-las”. Não é estranho? Há uma lista de coisas a serem evitadas: evitar doenças, evitar acidentes, evitar... filhos?!
            Pois Jesus ama as crianças. Ele está dizendo que não se deve impedir que elas se aproximem dele. E a advertência vale para os pais, os educadores e os poderosos que traçam as políticas do ensino. O regime soviético fez de tudo para desviar as crianças do caminho da fé. Chegaram a retirar água benta das pequenas pias que ficavam na entrada das igrejas e, com o microscópio, mostravam aos pequenos a presença de bactérias. As mesmas que se encontram em todo tipo de água. O objetivo era afastá-las da religião, mesmo à custa de trapaças!
            Eis o ensinamento de João Paulo II, na Encíclica Familiaris Consortio:
            “Na família, comunidade de pessoas, deve reservar-se uma especial atenção à criança, desenvolvendo uma estima profunda pela sua dignidade pessoal, como também grande respeito e generoso serviço pelos seus direitos. Isto vale para cada criança, mas adquire uma urgência singular quanto mais for a criança pequena e desprovida, doente, sofredora ou diminuída.
            Solicitando e vivendo um cuidado terno e forte por toda criança que vem a este mundo, a Igreja cumpre uma sua missão fundamental: revelar e repetir na história o exemplo e o mandamento de Cristo, que quis pôr a criança em destaque no Reino de Deus: ‘Deixai vir a mim os pequeninos e não os impeçais, pois deles é o reino de Deus’. (Mt 19,14)
            O acolhimento, o amor, a estima, o serviço múltiplo e unitário – material, afetivo, educativo, espiritual – a cada criança que vem a este mundo deverão constituir sempre uma nota distintiva irrenunciável dos cristãos, em particular das famílias cristãs.” (FC, 26)
            A História registra que, em todas as épocas, nenhuma instituição dedicou mais esforços materiais e pessoais à criança do que a Igreja de Jesus. Numerosas congregações foram criadas exatamente para acompanhar as crianças, dando a estas a formação humana, moral e espiritual que as próprias famílias não estavam em condição de lhes proporcionar.
            E uma das raras maldições de Jesus foi dirigida para quem escandaliza “um destes pequeninos” (cf. Mc 9,42).
Orai sem cessar: “Quem for pequenino, venha a mim!” (Pr 9,4)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 O que Deus uniu... (Mt 19,3-12)
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            No tempo de Jesus, havia controvérsias entre os rabinos judaicos a respeito da possibilidade de ser a esposa repudiada pelo marido que nela encontrasse algo de “desagradável”, isto é, por “não importa qual motivo”. E foi para lançar uma arapuca para Jesus que os fariseus lhe apresentam a questão. Afinal, Moisés autorizara que dessem à esposa um documento de repúdio. Eis o comentário de Hébert Roux, pastor da Igreja Reformada e interlocutor oficial junto à Igreja Católica:

            “Quando perguntam a Jesus o que é permitido ou proibido, ele sempre remete à ordem de Deus. Não há soluções para a vida moral fora desta ordem; não existe moral independente.
            “Nunca lestes...?” Jesus faz alusão ao relato da Criação e cita Gênesis 2,24. A ordem do casamento está inteiramente contida no próprio ato criador: “Deus fez o homem e a mulher”. Logo, é impossível conceber sua existência sem sua indissolúvel unidade.
            ‘O homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher; e os dois já não serão mais que uma só carne.’ No casamento, não há apenas justaposição, associação, colaboração de dois seres, mas coexistência, criação de uma unidade viva. Dividir, separar os dois elementos do casal é destruir a integridade do ser humano tal como Deus a quis e criou. Aquele que é casado deve saber que, por seu casamento, ele realiza seu verdadeiro destino de criatura de Deus; ele é plenamente ele-mesmo. ‘Assim, não separe o homem aquilo que Deus uniu.’
            É então que se mostra claramente a sutileza contraditória dos fariseus. Parece que eles tinham pronta a objeção: ‘Por que, então, Moisés mandou entregar à mulher uma carta de divórcio para repudiá-la?’
            Uma das astúcias de Satã consiste em opor a Escritura à Escritura, a ordem da Criação à ordem da Lei! Jesus não se deixa prender na armadilha. Por que Moisés legislou sobre o divórcio? Seria para aprová-lo ou sancioná-lo? De modo algum, declara Jesus, mas foi ‘por causa da dureza de vosso coração’. Assim, a Lei interveio por causa do pecado (Gl 3,19). Foi por ter havido transgressão, por ter o homem separado o que Deus havia unido, e porque a ordem do casamento não escapara à desordem introduzida no mundo pela Queda, que foi dada a Lei, para dar ao homem o conhecimento de seu pecado.
            É manifesto que a legislação mosaica tem por fim advertir o homem das consequências do repúdio. Logo, que ele examine duas vezes antes de consumar uma ruptura que será definitiva. Longe de aprovar ou facilitar o divórcio, o mandamento, ao contrário, tem por fim restringi-lo e sublinhar seu caráter irreparável, como tudo o que é consequência do pecado.
            Não é o divórcio que cria a ruptura dos vínculos conjugais; ele só leva a constatá-la e torná-la pública.”
Orai sem cessar: “Encontrei o amado de minha alma; segurei-o e não o soltarei!” (Ct 3,4)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Com. Católica Nova Aliança.

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 O Senhor lhe perdoou a dívida... (Mt 18,21-19,1)
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            A Boa Nova anunciada por Jesus à humanidade situa o perdão das ofensas bem no coração de sua mensagem. De um lado, Deus nos perdoa; do outro, nós perdoamos nosso próximo. Antoine Bloom, médico, monge e sacerdote ortodoxo, comenta este Evangelho:

            “Assim como os hebreus foram chamados por Moisés para fugirem do Egito, segui-lo na noite escura, atravessar o Mar Vermelho, cada um de nós é conduzido ao deserto onde começa uma nova etapa. Entre o Egito e o deserto, entre a escravidão e a liberdade, estende-se uma linha de demarcação. É o momento do ato decisivo, pelo qual nos tornamos homens novos, estabelecidos em uma situação moral totalmente nova.
            Em termos de geografia, esta linha foi o Mar Vermelho, mas na oração do Senhor, ela é o “perdoai nossas ofensas como também nós perdoamos”. Este “como nós perdoamos” representa o exato momento em que tomamos nossa salvação em nossas próprias mãos, pois tudo o que Deus faz depende daquilo que nós fazemos; e isto é de extrema importância na vida cotidiana.
            Se as pessoas que saem do Egito levam consigo seus medos, seus ressentimentos, seus ódios, suas queixas, elas permanecerão escravas na Terra Prometida. Não serão homens livres, nem mesmo homens em condições de construir sua liberdade. É por isso que, entre a provação sofrida e a tentação de nossos demônios familiares, encontra-se esta condição absoluta para a qual Deus jamais aceita algum tipo de arranjo: não haverá dois pesos, duas medidas; assim como perdoais, assim sereis perdoados. E o que não perdoais será retido contra vós.
            Não é que Deus não nos queira perdoar, mas se recusamos o perdão, transformamos em fiasco o mistério do amor, nós o recusamos e já não há lugar no Reino para nós. Já não podemos ir adiante se não somos perdoados, e não podemos ser perdoados enquanto não perdoarmos a todos aqueles que nos fizeram mal.
            Isto fica perfeitamente claro, nítido e preciso; e ninguém pode imaginar-se no Reino, pertence a ele, se permanece em seu coração a recusa de perdoar. Perdoar aos inimigos é a primeira característica do cristão, a mais elementar. Se nós falhamos nisto, não somos inteiramente cristãos e ainda erramos no ardente deserto do Sinai.
            A lei do perdão não é um estreito regato na fronteira entre a escravidão e a liberdade; ela é larga e profunda, é o Mar Vermelho. Os judeus não a transpuseram por seus próprios esforços, em barcos feitos pela mão do homem. O Mar Vermelho abriu-se pelo poder de Deus. Foi preciso que Deus os ajudasse a atravessá-lo. Mas, para sermos conduzido por Deus, devemos entrar em comunhão com essa qualidade de Deus, que é a capacidade de perdoar.”
            Então, perdoaremos?
Orai sem cessar: “Por amor a meus irmãos, eu direi: paz para ti!” (Sl 122,8)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

 Terás ganho o teu irmão... (Mt 18,15-20)
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            Ganhar e perder. Nossa sociedade capitalista entende muito bem de lucros e perdas. Mas cuidamos, em geral, de lucros e perdas materiais. Temos aquele livro de três colunas: deve/ haver/ saldo. Neste Evangelho, porém, está em questão a salvação das almas. Ou sua perdição eterna. No Juízo Final, virá o balanço inexorável...

            Certa mentalidade individualista – aliás, bem ao gosto de nosso tempo! – poderia levar o fiel a preocupar-se apenas em salvar a própria alma: cada um pra si e... Deus pra todos. Não cometer pecados mortais, cumprir os 10 mandamentos de Deus e os 5 da Igreja. Enfim, só para desencargo de consciência, uma esmolinha aqui e uma prenda para o leilão da paróquia. Ufa! Estou salvo!
            Graças a Deus, não é assim. Ninguém se salva sozinho! Tanto que nossa omissão diante daqueles que correm o risco de se perder é sempre um pecado grave. Viver uma vidinha tecida de comodismos e preferências, lazeres e conveniências, quando Deus se esgoela a clamar por operários para colher a messe que está madura (cf. Jo 4,35b), certamente causará a nossa perdição! Eis uma certeza: seremos severamente cobrados por nossa indiferença diante do próximo caído na estrada de Jericó.
            No Evangelho de hoje, o ensinamento de Jesus Cristo aponta para nosso compromisso em advertir o irmão que se desvia para, assim, lhe dar uma oportunidade de correção e conversão. Aponta para a responsabilidade dos educadores em corrigir o educando que erra, puni-lo adequadamente e reanimá-lo a voltar ao caminho do bem. Aponta igualmente para a irrecusável solidariedade que envolve a sociedade humana, independentemente de raça e cor, classe e nacionalidade. E ainda aponta para o nosso dever de oferecer ao próximo um estilo de vida e modelos de comportamento pautados na verdade e na justiça. Estamos todos no mesmo barco!
            Exemplos não nos faltam. A freira que é professora de ricos e deixa seu conforto para cuidar dos miseráveis de Calcutá. O jovem da nobreza espanhola que abre mão de seu brasão para levar o Evangelho à Índia, ao Japão e à China. O Papa já alquebrado que atravessa o planeta para falar de Jesus. O pastor negro que arrisca sua vida para defender os direitos de seus irmãos. A professora branca que ensina balé clássico na favela para ajudar os pequenos favelados a descobrirem a beleza...
            Madre Teresa, Francisco Xavier, João Paulo II, Martin Luther King e tantos outros mostram que isto é possível. Nossa vida existe para ser dada, perdida, sacrificada. É assim que o outro será salvo.

Orai sem cessar: “Anunciarei vosso Nome aos meus irmãos!” (Sl 22,23)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

terça-feira, 15 de agosto de 2017

PALAVRA DE VIDA

Ai do mundo! (Mt 18,1-5.10.12-14)
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           Esta passagem do Evangelho tem como eixo nossa relação com os pequeninos. Estes nos são apresentados por Jesus como modelo de vida: “Se não vos tornardes como crianças, não entrareis no Reino dos Céus”.

            Claro que Jesus usa a imagem da criança para dizer que somos filhos de Deus, suas crianças [tékna, no grego, como gosta de usar o evangelista João]. Assim, Deus é nosso Abbá, o paizinho querido. Quem se relaciona como filho: confiante, mas obediente, esse entra no Reino.
            Mas a mesma passagem traz uma séria advertência a respeito das ofensas contra os pequeninos. Jesus emite uma verdadeira cominação: “Ai do mundo por causa dos escândalos!” Esta palavra [skándalon] designava uma pedra, de tamanho pequeno, mas suficiente para levar alguém a tropeçar e cair. Também pode ser traduzida por “cilada” e “obstáculo”.
            Nosso tempo assiste – com a maioria indiferente – a uma série de agressões contra os pequeninos que Deus ama. A justiça holandesa acaba de considerar “constitucional” a formação de um partido político pró-pedofilia. Numerosos parlamentos, em todo o mundo, vão seguidamente legalizando o aborto intencional. Na mesma linha, autorizam o uso de embriões humanos como cobaias de laboratório. O último escândalo (por enquanto) consiste na legalização de uniões conjugais entre pessoas do mesmo sexo, ainda que seja uma opção contrária à natureza da própria pessoa humana, incluindo o direito de adotarem crianças que, obviamente, sofrerão os prejuízos psicoafetivos derivados da ausência da mãe ou do pai.
            A médio prazo – quem viver, verá... –, estas decisões equivocadas, baseadas em uma mentalidade neopagã, produzirão efeitos destrutivos sobre todo o tecido social, repetindo a história de antigos grupos sociais cuja decadência é sobejamente conhecida.
            O que está ao nosso alcance, além da luta política e da conscientização da sociedade? Temos o dever de investir em nossas crianças, assim como faria o próprio Senhor se estivesse na Terra. Elas pedem nossa presença, educação de bons hábitos, formação religiosa e espiritual e, acima de tudo, o exemplo edificante dos pais e formadores.
            Vale lembrar que, no início da pregação do Evangelho, as crianças não eram valorizadas entre gregos e romanos. Cabia ao paterfamilias decidir se os recém-nascidos iriam, ou não, ser mantidos vivos. O aborto era coisa banal. Crianças deficientes eram sumariamente eliminadas. O hábito de expor (abandonar ao relento) os recém-nascidos iria perdurar até o Séc. XVIII. A pregação do Evangelho e a atitude das famílias cristãs começaram a corrigir esse estado de coisas, lançando as primeiras sementes daquilo que hoje chamamos de “direitos humanos”.
            Proteção ao idoso, escola para pobres, hospitais para indigentes, fidelidade matrimonial – são “novidades” trazidas pela evangelização. Sem o Evangelho, voltamos todos às cavernas...
Orai sem cessar: “Defendei antes o fraco e o órfão!” (Sl 82,3)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.